"O Escândalo da Sabesp", reportagem especial para o DCM

O site Diário do Centro do Mundo (DCM) realizou uma campanha de crowdfunding entre os seus leitores para financiar uma reportagem sobre o escândalo da crise hídrica da Sabesp, que ocorreu entre maio de 2014 e outubro de 2015. Na época, os reservatórios do sistema Cantareira quase secaram e o governo do tucano Geraldo Alckmin recorreu às obras de captação do volume morto.


O repórter Pedro Zambarda de Araújo teve contato com denúncias e documentos técnicos protocolados no Ministério Público que mostram que a crise provocada pela maior seca em 80 anos poderia ter sido evitada se milhões de reais não tivessem ido ao bolso dos acionistas privados. A corrupção da Sabesp foi tema de mais 20 reportagens e de um documentário sobre o assunto. Confira o material completo abaixo, começando pelo vídeo publicado em 4 de dezembro de 2015.

A reportagem especial foi realizada entre os meses de fevereiro e outubro do período. Novas apurações podem surgir.


EXCLUSIVO: Ministério Público investiga “máfia” do vazamento de água da Sabesp

Postado em 13 fev 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/exclusivo-ministerio-publico-investiga-mafia-ligada-a-perdas-de-agua-da-sabesp/

Com este texto, inauguramos a série de reportagens sobre a verdadeira história da crise de falta de água em São Paulo. É o quarto projeto financiado pelos leitores do DCM através de crowdfunding no site Catarse. O repórter Pedro Zambarda de Araújo está apurando o caso. Fique ligado.


Uma denúncia é investigada no Ministério Público do Estado de São Paulo desde novembro de 2014. O autor é ex-funcionário da Sabesp na Unidade Norte e hoje atua como prestador de serviços de uma empresa ligada às terceirizadas de seu antigo emprego. “Esta é uma prática usual na empresa, de forma que os nomes de ex-funcionários não aparecem nos contratos”, diz o documento.

“Várias ações fraudulentas são praticadas em licitações de companhias de saneamento, como Dae, Saae, Sabesp e tais ações são de conhecimento geral de empresas e pessoas que atuam nesse mercado”. De acordo com o ex-funcionário, é inusitado como a polícia, a mídia e o ministério público não tiveram ciência de tais eventos, que ele define como uma formação de máfias de empresas marcadas nos setores de controle de perdas de água, esgoto, serviços de manutenção, métodos não destrutivos e equipamentos.

“As empresas que não compõem o grupo da máfia só ganham licitações onde não são exigidos profissionais nível 2 e 3, pois a certificação de nível 1 é a que coloca menos dificuldade. Mas considerando que o grupo direciona 90% das licitações com ajuda de superintendentes e do diretor Paulo Massato, que é amigo pessoal dos diretores dessas empresas, a certificação nível 1 não adianta para companhias iniciantes”, frisa a denúncia entregue ao ministério público.

Paulo Massato Yoshimoto foi o homem que admitiu em uma gravação vazada que a situação de abastecimento da capital paulista é de “agonia” se as chuvas de 2015 repetirem o clima seco de 2014. “Saiam de São Paulo porque aqui não vai ter água”, sugere numa reunião.

A denúncia anônima liga Massato a uma associação com integrantes de empresas que venceram 38 licitações dentro da Sabesp em pesquisa de vazamentos, um dos maiores problemas na queda do nível do Sistema Cantareira atualmente, com a diminuição da pressão hídrica que aumenta o desperdício de um recurso que está se tornando escasso.

O grupo, acusado no documento como uma máfia, uma formação de cartel de empresas selecionadas, chama-se Associação Brasileira de Ensaios Não Destrutivos (ABENDI).

O que há de errado dentro da associação?

A ABENDI se define, em seu site oficial, como “uma entidade técnico-científica, sem fins econômicos, de direito privado, fundada em 1979, com a finalidade de difundir as atividades de Ensaios Não Destrutivos (END) e Inspeção, preservando a vida das pessoas e o meio ambiente”. Na internet, não há informações de quem ocupa a diretoria e os principais cargos da associação.

O documento anônimo enviado ao ministério público aponta que nove membros da comissão da ABENDI são diretores de empresas vencedoras das licitações contra vazamentos da Sabesp. Da BBL Bureau Brasileiro temos Nicolau Sevciuc e Rodrigo Augusti, enquanto Carlos César Gurnier representa a Sanit Engenharia e Serviços. No arquivo estão também Carlos José Teixeira Berenhauser, da Enops Engenheria; Eduardo Augusto Ribeiro Bulhões Filho, da B&B Engenharia; João Augusto Sanches Alves, da Opertec Engenharia; Ramon Velloso de Oliveira, da Cobrape Companhia Brasileira de Projetos e Empreendimentos; Renato Gomes Dias, da Estudos Técnicos e Projetos ETEP; e, por fim, Rubem da Costa Júnior, da Restor Manutenção de Equipamentos Eletromecânicas.

A reportagem do DCM apurou na internet o currículo de cada um dos engenheiros. Todas as empresas listadas pelo documento foram vencedoras das licitações de pesquisas para vazamentos de águas da Sabesp, o que tiraria a independência da ABENDI como órgão regulador ou de inspeção.

No caso do escândalo da Petrobras, por exemplo, ela recebe auditoria da PricewaterhouseCoopers (PwC) e também é regulada pela Agência Nacional de Petróleo (ANP). Nenhuma destas instituições possui membros com o nível de conflito de interesses que envolve a ABENDI e a Sabesp até o momento.

O MP cobrou explicações das oito empresas acusadas de possuírem conflitos de interesses dentro da ABENDI. Carlos Berenhauser, engenheiro da Enops e um dos acusados, respondeu que “participa como membro do comitê setorial de saneamento, mas isso não lhe confere nenhum poder de influência nos resultados das provas desenvolvidos pela entidade para qualificação de profissionais”.

Outras empresas disseram que não participam de nenhum conluio ou cartel, e reafirmaram que cumpriram os objetivos das licitações. Uma nona empresa, chamada Jobs Engenharia e Serviços, afirmou em documento que já foi recusada três vezes pela ABENDI e venceu apenas um dos pregões, defendendo a atuação da associação.

Se a empresa de um dos membros de sua comissão vence a licitação, existirão interesses econômicos em jogo maiores do que os critérios técnicos para lidar com a redução de perdas de água dentro da Sabesp. Esta irregularidade grave se conecta com um escândalo maior dentro da própria empresa de capital misto que é controlada pelo governo do estado de São Paulo.

Contratos de R$ 1,1 bilhão sob investigação

A Sabesp instaurou um Programa de Redução de Perdas da Sabesp, entre 2008 e 2012, sob o custo de R$ 1,1 bilhão em contratos. A atitude foi resultado de alertas desde 2003 que apontavam para uma estiagem forte na região sudeste e uma previsão catastrófica para 2010. A informação foi veiculada no jornal Folha de S.Paulo e não se concretizou naquele ano, mas está para acontecer em 2015.

Por este motivo, a empresa lançou este plano de manutenção de suas reservas hídricas e fez um investimento monetário em quatro anos. O problema é que o programa foi implementado financeiramente e a Sabesp continua a desperdiçar 36% de toda a água captada nos mananciais em seus canos. Parte das vegetações também foi devastada, o que aumentou os efeitos da maior estiagem na região sudeste brasileira dos últimos 45 anos.

Em 2013 foram perdidos 924,8 bilhões de litros, quantidade equivalente à capacidade máxima do sistema Cantareira, que atualmente está em 5% do seu volume morto. Para ter uma idéia, 623 bilhões de litros de água seriam suficientes para abastecer uma cidade com 685 mil habitantes, como Osasco, o sexto município mais populoso de São Paulo. As perdas de 2014 estão estimadas em uma quantidade maior, mas os dados não estão fechados.

A revista Carta Capital informou que o ministério público passou a investigar a Sabesp em maio de 2014, para verificar onde foi parar o investimento bilionário que deveria estancar perdas hídricas e aumentar a eficiência do serviço. A investigação segue até agora.

A empresa foi parcialmente privatizada no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso e abriu capital em 2002 na bolsa de Nova York. Mesmo com a falta de água crescendo em São Paulo, a Sabesp é uma das maiores pagadoras de dividendos dos últimos seis anos, com rendimento em média de 4,9% ao ano em 2013. O sistema Cantareira é responsável por 73,2% da receita bruta operacional, o que revela uma total incapacidade da companhia em pagar bem os seus investidores privados e não retardar uma crise anunciada na sua maior reserva hídrica.

O encontro entre dois escândalos

O Ministério Público fez uma denúncia formal contra 25 pessoas acusadas de participação em fraudes de licitações no Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) da cidade de Sorocaba e em outros locais no Brasil, que não são abastecidos pela Sabesp. A operação foi batizada de Águas Claras, iniciada em 2012 e deu origem a um inquérito de 60 volumes entregue em janeiro de 2014.

A suposta fraude dentro da Saae ocorria na forma de pagamento de propinas entre as empresas, segundo a investigação. Uma empresa chamada Allsan teria coordenado os desvios com outras 29 desde 2007, resultando em outro rombo de R$ 1 bi. A Polícia Civil participou ativamente na apuração das denúncias.

As empresas citadas na Operação Águas Claras são sete que compõem a ABENDI: Enops, Sanit, Restor, BBL, Opertec, Cobrape e Etep. Na mesma investigação entram também OPH, Sanesi Engenharia, Ercon Engenharia e Enorsul Saneamento. Por fim, a empresa Job Engenharia, que se defendeu do Ministério Público em um documento, também consta na investigação de Sorocaba. Há gravações telefônicas registradas na investigação com acusados acertando a combinação de preços para vencer licitações.

Os escândalos da Saae e da Sabesp podem ter relação porque envolvem as mesmas empresas e outras companhias relacionadas à ABENDI, que deveria selecionar criteriosamente as companhias responsáveis pela contenção de perdas e tratamento das reservas hídricas. Os dois casos podem somar quantias bilionárias relacionadas com práticas de corrupção por dentro de empresas responsáveis pelo fornecimento de água e saneamento.

Dentro da Sabesp

O DCM entrou em contato com Renê dos Santos, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Sabesp. “Os funcionários pedem contratos que são estabelecidos com empreiteiras e a empresa não é transparente e não nos fornece. Há rumores que são ouvidos dentro da empresa de uma ‘indústria do vazamento’, mas nós, como trabalhadores, não temos acesso aos documentos que poderiam esclarecer sobre a real situação da companhia”, explicou.

“Os rumores de empresas ligadas a diretores da Sabesp existem desde antes da crise hídrica do sistema Cantareira. A falta da água aumentou a pressão em cima dessas denúncias. O que temos são algumas investigações do ministério público, sendo que uma delas envolveu até a equipe de comunicação da Sabesp. Não sei que fim levou isso”, disse o sindicalista. Para ele, a crise é uma oportunidade para tentar reformar a empresa.

O sindicato teme que a Sabesp passe por uma reestruturação forte após o período do Carnaval, o que pode acarretar muitas demissões e poucas contratações. “Essa seria uma ação muito prejudicial para lidar com a crise atual, quando a empresa mais precisa de pessoas para cuidar do abastecimento. Precisamos de mão-de-obra operacional, enquanto os grandões aposentados nunca são mexidos”, disse Renê Santos, que também mencionou atrasos de até 80 dias da companhia para explicar os locais em que falta água ao público por pura falta de transparência.

Renê Santos deu uma pista de quem pode estar fazendo denúncias anônimas ao ministério público e entregando empresas que supostamente participam de conluio e diretores que são complacentes com este tipo de crime. Ele relembrou o áudio de Dilma Pena que vazou em outubro de 2014 revelando que “ordens superiores” impediram a divulgação da situação real das reservas da Cantareira para não prejudicar a reeleição do governador Geraldo Alckmin.

“Essas denúncias anônimas são levantadas geralmente por ex-diretores da Sabesp que de alguma maneira foram desligados de seus cargos. O problema é esse, porque geralmente eles são poupados e têm acesso direto aos documentos. Nós, trabalhadores de baixo, não temos acesso a isso e a Sabesp não tem a abertura que uma empresa pública deveria ter”, completou.

Novas investigações

Em outra apuração separada, o ministério público também irá verificar o investimento de R$ 300 milhões feito pela Sabesp em obras emergenciais nas cotas do volume morto do sistema Cantareira, que secará com a baixa captação da água de chuvas.

Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi aberta na Câmara Municipal de São Paulo em agosto de 2014. O atual presidente da Sabesp e sucessor de Dilma Pena, Jerson Kelman, será convidado para depor sobre o caso.

Os investimentos da Sabesp em pesquisa de vazamentos e medidas emergenciais sem efeitos concretos podem ter gerado um desvio de até R$ 1,4 bilhão, valor que pode ter escoado entre as empresas envolvidas diretamente em todo processo. Se houver ligação entre o escândalo da empresa paulista e a Saae, investigada em Sorocaba, a corrupção pode ultrapassar R$ 2 bi.

Se as investigações apontarem novos fatos, o diretor metropolitano Paulo Massato pode ser convidado novamente para depor. Para verificar o real montante de desvios, a ABENDI e as empresas vencedoras de licitações na área de vazamentos de água precisam ser investigadas de maneira efetiva.

****

Sobre a matéria publicada no Diário do Centro do Mundo, intitulada Ministério Público investiga “máfia” de vazamento de água da Sabesp e assinada por Pedro Zambarda de Araujo, a ABENDI esclarece que:

  • Somos uma entidade técnico-científica, sem fins econômicos, de direito privado, reconhecida nacional e internacionalmente, que atua por meio de qualificação e certificação de pessoas, normalização, treinamentos, pesquisas e projetos técnicos, eventos e publicações, voltadas à qualidade, aprimoramento tecnológico, saúde e segurança do trabalho e gestão empresarial, contribuindo para o crescimento sustentável da indústria e beneficiando a sociedade, acreditada pelo Inmetro desde 1977.
  • A ABENDI, desde 1981, desenvolve esquema de qualificação e certificação de pessoas em diversas modalidades, para diferentes setores industriais. Um desses esquemas é o Sistema de Treinamento, Qualificação e Certificação de Pessoas para Detecção de Vazamentos Não Visíveis em Tubulações Enterradas de Água.
  • Esse esquema foi implementado em 1990 atendendo à solicitação da própria Sabesp e faz parte de um Programa de Controle de Perdas de Água.
  • A Sabesp, por sua vez, baseou seu programa em modelo japonês e contou com o apoio da JICA (Japanese Internacional Cooperation Agency) para estruturar um centro de exames de Qualificação.
  • Para o  detalhamento técnico desse esquema, a ABENDI constituiu, em 1999, o Comitê Setorial de Saneamento Básico integrado por técnicos das empresas envolvidas nesse tipo de inspeção.
  • Todas as reuniões desse Comitê são eminentemente técnicas, conforme comprovação nas Atas disponíveis a todos os interessados. Nessas reuniões, em nenhum momento são discutidos quaisquer aspectos relacionados à licitação ou questão de preços.
  • A ABENDI não é um órgão regulador ou de inspeção. O esquema de qualificação faz parte dos requisitos contratuais da Sabesp.
  •  Além desse esquema, a ABENDI possui outros 27 esquemas de certificação baseados em normas nacionais e internacionais, notadamente ABNT e ISO. São aproximadamente 29 mil profissionais atendidos em 36 anos de atuação.
  • A ABENDI não participa de licitações na área de vazamentos. Apenas o esquema de certificação de pessoas por ela desenvolvido é um dos itens solicitados.
  • A ABENDI, em nenhum momento, foi solicitada a selecionar as companhias para contenção de perdas e reservas hídricas.
  • Por fim, esclarecemos que o controle de perdas implementado pela Sabesp atingiu um resultado plenamente satisfatório, reduzindo índices de perda da ordem de 25,6% para 17%.

“Nem privada, nem pública, nem nada”: a estranha história da “privatização” da Sabesp


Postado em 18 fev 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo

Este é um novo texto da série de reportagens sobre a verdadeira história da crise de falta de água em São Paulo. Foi o quarto projeto financiado pelos leitores do DCM através de crowdfunding no site Catarse. De onde veio isso tem mais. Fique ligado.


A história da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) começa 42 anos atrás, em 1973, quando foi criada como uma empresa pública por meio da Lei Estadual nº 119 de 29 de junho. O governador da época era Laudo Natel, que foi presidente do São Paulo Futebol Clube e responsável pela unificação de onze usinas hidrelétricas que deram origem à Companhia Energética de São Paulo (CESP).

Seu primeiro presidente foi o general Luiz Phelippe Galvão Carneiro da Cunha, que em 1977 saiu para comandos militares, abrindo espaço para o trabalho de engenheiros.

Um ano antes da criação da Sabesp, a distribuição de água era feita pela empresa municipal SAEC. De acordo com um estudo da Secretaria de Planejamento do Estado, essa instituição tinha perdas de água estimadas em 30% e uma previsão de reduzi-las em até 20% na década de 1980. Em 2014, a Sabesp aumentou as perdas por vazamentos para 36%, enquanto ocorre a maior seca no Sudeste em 84 anos.

A realidade das estatais na época da ditadura militar mudou com a abertura democrática de 1985 e com as mudanças econômicas do governo Fernando Collor em diante.

Fernando Henrique Cardoso viria com a ideia de privatizar boa parte delas, vendendo essa prática como a solução para todos os males econômicos do mundo.

A descentralização dos recursos hídricos

A companhia abriu suas ações para a iniciativa privada em 1994, durante o governo de Luiz Antônio Fleury Filho (PMDB). Fleury iniciou o Projeto Tietê, uma série de iniciativas malfadadas para despoluir o rio transformado em esgoto. Na época, a Sabesp conseguiu um empréstimo com órgãos internacionais, principalmente o banco japonês JBIC.

A verba só foi liberada pelo governo FHC quando seu sucessor, o tucano Mario Covas, assumiu. Nem Fleury, nem Covas, nem Serra e nem Alckmin mudaram a situação de calamidade.

Em 1995, a Sabesp passou a descentralizar sua gestão, baseando-se em bacias hídricas para abastecer o estado. Foi desta maneira que ela se dividiu unidades de negócio que se são adequadas para casa região, seguindo demandas ambientais e sociais impostas pelo governo vigente.

Com essa reestruturação, a Sabesp fez seu IPO – oferta pública inicial – na Bovespa em 2002 e passou a ter suas ações listadas na Bolsa de Valores de Nova York, a NYSE.

A Sabesp, então, foi privatizada?

Não é correto dizer que a companhia estatal foi privatizada porque o acionista majoritário atualmente continua a ser o próprio governo paulista. As ações listadas em bolsa excedentes pertencem a investidores minoritários. Portanto, a designação correta que podemos dar a Sabesp é que ela é uma empresa de gestão de recursos hídricos e saneamento de capital misto.

Se a Sabesp então tem uma companhia com participação privada, ela já tem uma agência independente que regule suas ações, como é o caso da Agência Nacional de Petróleo (ANP) e a Petrobras, correto?

Não.

Por pelo menos cinco anos, desde a abertura das ações em bolsa de valores, a empresa operou sem nenhum órgão regulador, exceto instituições como a Associação Brasileira de Ensaios Não Destrutivos (ABENDI). Essa mesma instituição foi denunciada ao Ministério Público por aprovar empresas em 38 licitações sendo que seus diretores estão diretamente relacionados com elas, num rombo de pelo menos R$ 1,4 bilhão em contratos para conter vazamentos de água.

Uma agência foi criada em 2007 pela Lei Complementar 1.025/2007 regulamentada pelo Decreto 52.455. A Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo, chamada de ARSESP, é vinculada à secretaria de Energia e, por meio de delegação da Aneel, fiscaliza as empresas de abastecimento de água, as de gás canalizado e as distribuidoras de energia paulistas.

Desta forma, a Sabesp não foi totalmente privatizada, mas demorou pelo menos cinco anos para ter uma auditoria capacitada para sua gestão. Os diretores da Arsesp são escolhidos pelo governo estadual.

As contradições problemáticas da Sabesp

O advogado Vladimir Pinheiro tem 46 anos e foi um dos responsáveis pela elaboração da Lei Federal de Saneamento Básico entre 2003 e 2010. O DCM foi conversar com ele para entender algumas contradições que existem na Sabesp após a entrada de investimentos privados na empresa.

De acordo com o advogado, existe um estudo na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) que relaciona o aumento das tarifas da água para além da inflação brasileira com o crescimento da atratividade da companhia no mercado de capitais. “O autor do estudo é um professor de métodos quantitativos e ciências sociais. No levantamento é possível verificar que o aumento de preços está diretamente relacionado com o desempenho da Sabesp na bolsa”, diz.

A questão do desempenho das ações da empresa gestora de recursos hídricos é só um dos indícios de um problema maior. Pinheiro questiona o caráter de capital misto da companhia. “Existem dois modelos neste cenário. Ou a empresa é privada, com forte regulação externa, ou a gestão é pública sem interesse no lucro. A Sabesp não é nenhuma das duas coisas. Isso existe porque o faturamento da empresa está vinculado à água que ela vende. Até o esgoto é incluído no mesmo cálculo. Atualmente, ao receber um comunicado de que é necessário fazer um racionamento em São Paulo, as receitas e as ações deveriam cair. Mas não é o que acontece, curiosamente”, aponta.

Em outras grandes metrópoles, a gestão da água é completamente diferente de São Paulo. No caso de Nova York, uma empresa pública é responsável pelo fornecimento, sem fim de lucro. Em Paris e em Berlim, eram empresas privadas que forneciam recursos hídricos e, recentemente, elas foram estatizadas. O nome da companhia responsável pela água na França é Eau de Paris, que foi privatizada por 20 anos, não conseguiu bons resultados com aumentos de tarifas e retornou ao controle do governo.
“A Sabesp cobra esgoto mais caro, vence concorrência na gestão de águas subterrâneas, como ocorreu com a ABAS (Associação Brasileira de Águas Subterrâneas) e ainda desestimula a água de reuso, práticas que poderiam evitar a crise hídrica. Convencer as pessoas a poupar é uma das coisas que não passa pela cabeça da empresa, porque ela sempre precisa vender mais água. É essa a lógica”, diz Vladimir Pinheiro.

O único órgão que poderia regular as ações privadas da Sabesp seria a ARSESP. No entanto, seus membros são nomeados pelo governo do estado, o mesmo que é acionista majoritário. Desta maneira, há outro nítido conflito de interesses na empresa, tanto se ela caminhar para o interesse público como se ela for se comportar como uma instituição privada.

“O que acontece com a Sabesp é como se a raposa tomasse conta do galinheiro. Ou você tem um consórcio privado regulado, ou você tem uma empresa pública guiada por outros interesses que não sejam o lucro. O regulador é necessário para dar credibilidade para as metas da empresa, justificando o investimento do acionista. Como o governo representa tanto a Sabesp quanto a agência, isso não é possível”, afirma o advogado.

A Sabesp não tem concorrência e sua agência reguladora possui integrantes que possuem os mesmos interesses dentro da empresa. Isso é contraproducente porque ela é o monopólio de fornecimento de água em São Paulo. Numa lógica capitalista comum, a Sabesp teria concorrentes que a forçariam a melhorar seu desempenho técnico ou a reduzir seus preços de acordo com o quadro total.

Além da ARSESP e da Sabesp, há uma peça no quebra-cabeça que poderia resolver os problemas no conflito de interesse entre investimentos privados, as instituições e o governo estadual.

A prefeitura poderia cobrar mais a Sabesp pelo fornecimento de São Paulo

A Sabesp não atende a capital paulistana sem que exista um contrato para seus serviços. O responsável pelo elo que liga a empresa do governo estadual, que monopoliza o fornecimento de água, e a cidade, bem como outros municípios, é a prefeitura.

A instituição contratante é a mesma responsável pelo município. Então ela deveria pelo menos exigir a regulação da Sabesp, não é? Não é o que acontece na cidade e em outros municípios a realidade é diferente. “Em Recife, por exemplo, há uma grande secretaria municipal focada no saneamento. E a Sabesp deles chama-se Compesa, ligado à cidade. Eles não dependem necessariamente do governo do estado”, diz Vladimir Pinheiro, relembrando de exemplos diferentes no nordeste brasileiro.

Na gestão Marta Suplicy, em 2004, foi arquitetada a criação de uma agência vinculada à prefeitura, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo impediu o progresso da iniciativa por romper com cláusulas impostas pelo governo do estado.

Na atual crise, a prefeitura ajudaria a cidade toda se pressionasse o governador, a agência reguladora e a própria Sabesp.

Um problema recorrente

A seca do sistema Cantareira provavelmente obrigará todas as instâncias do Estado a investir para evitar consequências mais graves da crise. Trata-se de um caso bem conhecido de privatização de lucros e socialização de prejuízos porque o colapso hídrico de São Paulo certamente afetará o PIB do país.

Os problemas de investimento na contenção de vazamentos, só da Sabesp, chegam a R$ 1,4 bilhão. Se vincularmos este escândalo ao caso da Saae, em Sorocaba, que engloba as mesmas empresas da ABENDI, o dinheiro desviado soma mais de R$ 2 bilhões. Se foi injetada verba e a perda de água não diminuiu no fornecimento, é porque provavelmente alguém embolsou sem que o problema tenha sido solucionado. A Sabesp lucra com venda de volumes de água, e para ela não interessa o racionamento ou o bom uso dos recursos, mesmo que isso esteja provocando seca agora.

Tudo isso ocorre não apenas pela lógica do lucro empresarial privado, mas porque a empresa responsável pelo monopólio das águas de 364 dos 645 municípios paulistas, de acordo com o site oficial, não recebe a regulação adequada. Não há quem questione seus métodos dentro do estado de São Paulo.

“Este é um problema recorrente no Brasil. No atual escândalo da Petrobras, quantas vezes você ouviu o nome da Agência Nacional de Petróleo, a ANP? Eu não ouvi nenhuma vez. E ela deveria fiscalizar, não deveria?”, finaliza o advogado Vladimir Pinheiro, especialista em saneamento.

Exclusivo: documentos provam que Sabesp adiou anúncio de crise hídrica


Postado em 21 fev 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo

Esta é a nova reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado. 

O diretor metropolitano da Sabesp, Paulo Massato Yoshinomoto, prestou um depoimento ao Ministério Público no dia 14 de novembro de 2014, às 15h40. O DCM teve acesso ao documento integral de sua fala, que revela quando, afinal de contas, a empresa considerou crítica a situação do sistema Cantareira, quatro meses antes da utilização do volume morto.

“A partir de dezembro de 2013 notamos uma queda da vazão do afluente às represas do sistema Cantareira. No entanto, em janeiro deste ano de 2014, verificamos uma queda anormal do regime de chuvas, motivo pelo qual consideram esse mês como marco inicial da atual crise hídrica”, disse Massato ao MP.

Na época, o nível das represas do sistema caiu de 29% para 16%. De acordo com Samuel Barrêto, gerente do departamento de água da ONG The Nature Consevancy (TNC), o nível necessário para a Cantareira operar por um ano é de 30%.

A estimativa da organização tanto é verdadeira que no dia 15 de maio de 2014, quatro meses depois da crise decretada dentro da Sabesp, a Cantareira baixou até 8,4%. Ao invés de decretar o racionamento imediato, a companhia realizou o bombeamento do volume morto das reservas locais, água que fica num nível abaixo das comportas de abastecimento, na intenção de elevar a represa até 18%.

Nem a Sabesp e nem o governador Geraldo Alckmin relataram publicamente na época a real situação de calamidade do sistema responsável por 73,2% da receita bruta operacional da empresa. A seca na região sudeste é inédita, no entanto a Sabesp sabia que o fornecimento de água entraria em colapso.

Um documento recentemente foi enviado à CPI que investiga a Sabesp desde 2014. O arquivo, chamado “Plano de Contigência II”, menciona abertamente que o racionamento de água não foi decretado antes de propósito. Diz o documento: “O Plano de Contingência II está, então, evitando que a população seja submetida ao rodízio e aos malefícios correspondentes à sua implementação, cujos mais impactantes são os riscos à Saúde Pública devido às pressões negativas que as redes ficam submetidas”.

O mesmo arquivo diz que o caso de racionamento trará problemas de abastecimento aos diferentes imóveis de São Paulo.

Quem é Paulo Massato

O diretor metropolitano Massato entrou na Sabesp há 32 anos, em 1983, sendo 11 deles na mesma função. “Ocupei o cargo de superintendente de manutenção, de 1987 até 1990. De 1990 a 1995, atuei como superintendente de produção de água. De 1995 a 2002, como superintendente de planejamento. Após, de 2002 até 2004, novamente como superintendente de produção de água e de 2004 até os dias atuais, tenho atuado como diretor metropolitano”, disse Massato em depoimento ao Ministério Público.

Em janeiro deste ano, ele declarou em áudio vazado em uma reunião interna: “Alguém brincou aqui, mas é uma brincadeira séria. Vamos dar férias. Saiam de São Paulo porque aqui não tem água, não vai ter água para banho, para limpeza da casa, quem puder compra garrafa, água mineral. Quem não puder, vai tomar banho na casa da mãe lá em Santos, Ubatuba, Águas de São Pedro, sei lá, aqui não vai ter”.

Massato gerenciou o setor de perdas da Sabesp entre 1996 e 2003, quando trabalhava no setor de planejamento da instituição. Depois, com as previsões catastróficas para 2010, ele não poderia ter emitido esse aviso anteriormente? Quem “brincou” dentro da Sabesp?

Uma denúncia anônima surgiu no mesmo período em que Paulo Massato prestou depoimento ao Ministério Público, em novembro do ano passado. No documento, assinado por um ex-funcionário, ele é apontado como amigo de diretores das empresas vencedoras de licitações de vazamentos de água, o que poderia ter atenuado a seca da Cantareira. A facilitação era feita via Associação Brasileira de Ensaios Não Destrutivos (ABENDI).

Como a crise só foi decretada quando o nível caiu para 16%? Quatro meses depois, o sistema passou a operar no volume morto, com alguns poucos picos.

Por que a Sabesp não falou publicamente sobre a crise

“O que temos atualmente é um inquérito de cinco volumes. No atual estágio, estamos fazendo um levantamento pericial das oito empresas acusadas na denúncia e que participam de cartel. Estamos apurando o que cada companhia fez e quais contratos deixaram elas nesta determinada posição”, disse ao DCM Marcelo Milani, do MP.

Na primeira reportagem da nossa série sobre a Sabesp, apuramos que a ABENDI teria participado em 38 licitações de contenções de vazamentos. O promotor disse que teve acesso a mais documentos e, ao todo, seriam 42 contratações que vão ser investigadas pelo Ministério Público. “Temos o valor de um rombo em torno de R$ 1 bilhão, mas precisamos ainda averiguar a veracidade desta informação”, complementou Marcelo Milani.

A Sabesp e as empresas de capital misto, ou mesmo as públicas, colecionam denúncias, de acordo com o promotor Milani.

A crise da Cantareira foi declarada internamente na empresa em janeiro de 2014. O volume morto passou a ser utilizado quatro meses depois e os níveis do sistema nunca voltaram ao padrão de dezembro de 2013, com cerca de 30%, o necessário para um ano sem problemas. Por que o racionamento não foi decretado?

Dilma Pena, presidente da Sabesp até o ano passado, falou em um áudio que vazou da companhia que “ordens superiores” impediram que a população fosse alertada da falta d’água. O assunto só voltou à tona no final do ano.

Em outubro de 2014, o tucano Geraldo Alckmin foi reeleito em primeiro turno para o seu segundo mandato consecutivo — quarto, considerando o período em que ficou entre 2001 e 2006. No mês seguinte, surgiu a denúncia anônima apontando para formação de cartel interna com fornecedores da Sabesp, citando o nome de Massato como facilitador.

Foi só acabarem as eleições para que aparecessem vazamentos e acusações no Ministério Público.

Alckmin descartou plano da Sabesp de 2014 que teria economizado 120 bilhões de litros de água

Postado em 24 fev 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.


“Estamos conseguindo superar essa seca duríssima sem levar a população a riscos e sofrimento”, afirmou o governador Geraldo Alckmin ao jornal O Estado de S.Paulo em agosto de 2014. O tucano havia descartado um plano de racionamento de água elaborado pela Sabesp em janeiro daquele ano, o mesmo período oficial do começo da crise hídrica. No mês seguinte, começaram os rodízios forçados de água em regiões abastecidas pelo sistema Cantareira.

Na prática, a água costumava acabar no período da madrugada sem aviso prévio da Sabesp e de nenhuma outra autoridade. Era uma espécie de racionamento, embora, nos projetos, a empresa fornecedora de água descartasse qualquer tipo de redução no fornecimento.

A negligência do governador, ao barrar o rodízio que poderia ter começado logo com o projeto de janeiro de 2014, está documentada em um email enviado ao promotor Otávio Ferreira Garcia. A correspondência foi anexada em um inquérito civil instaurado em 22 de julho do ano passado. O autor é o próprio jornalista do Estadão, Fabio Leite, que entrevistou Alckmin. “Creio que esse documento possa ajudar na investigação da crise da água. Se o plano tivesse sido posto em prática, a partir de fevereiro [de 2014], a economia teria chegado a 120 bilhões de litros, 12,3% da Cantareira, sem sacrificar os demais sistemas”. A mensagem é de 4 de fevereiro deste ano e consta na investigação do Ministério Público.

O DCM teve acesso ao documento “Rodízio do Sistema Cantareira 2014”, recusado por Alckmin em janeiro do ano passado, e também ao arquivo “Plano de Contingência II”, que foi formalizado pela Sabesp em junho. O segundo documento foi obtido com exclusividade. Comparando ambos, é possível ver como o discurso sobre os problemas do sistema Cantareira mudou radicalmente após a decisão do governador.

“Evitar o colapso”

O projeto de racionamento da Sabesp pensado em janeiro de 2014 foi elaborado pelo superintendente da unidade de produção de água da empresa, Marco Antônio Barros. A iniciativa traz dados sobre a situação de mananciais, cujas áreas foram devastadas, além de preocupações com o bem-estar da população e utiliza a palavra “colapso” para se referir ao esgotamento das reservas do Cantareira.

“Todas as estratégias foram adotadas concomitantemente no intuito de evitar a adoção do rodízio, pelo constrangimento que este causa à população”, afirma o documento de racionamento em seu tópico sobre o histórico do problema, abordando as medidas adotadas em 2013. E ele estabelece como objetivo “reduzir a produção do sistema Cantareira para evitar o colapso de seus mananciais”.

O uso do termo “colapso” é evitado publicamente tanto pela Sabesp quanto pelo governador Geraldo Alckmin. Fala-se em “crise hídrica”. A adoção de um rodízio era a última alternativa da Sabesp, segundo o projeto. O volume morto não foi mencionado em nenhuma passagem.

A situação de outras reservas é alarmante, segundo o mesmo arquivo. “O sistema Guarapiranga também está no seu limite de captação, com base na sua outorga para retirada de água da manancial. Com isso seria uma ampliação do sistema do Alto Tietê sobre o Cantareira, tornou-se praticamente inviável em caráter perene, servindo apenas para manutenções temporárias”.

O plano de rodízio foi entregue ao Departamento de Águas e Energia Elétrica de São Paulo (DAEE), cumprindo a formalidade para obter a aprovação e tentar evitar o pior antes do agravamento da seca na região sudeste. De acordo com o documento, a ARSESP (Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo), nomeada pelo governo Alckmin, seria a responsável pelo monitoramento da execução e alterações de contratos.

Em fevereiro, Geraldo Alckmin barrou o plano e a Sabesp lançou o programa de bônus para reduzir a conta do cidadão que fechar mais sua torneira. Foi uma “decisão técnica”, sob a justificativa de que o racionamento reduziria a pressão nas tubulações e contaminaria a água. O problema é que o volume morto também reúne sedimentos do fundo das represas que fazem mal à saúde se não forem corretamente tratados.
Os rodízios se tornam “malefícios”

Um segundo documento foi produzido pela diretoria metropolitana da Sabesp, sob tutela de Paulo Massato há 11 anos, em junho de 2014. No “Plano de Contingência II”, a palavra colapso desaparece e entra uma série de medidas para controle de vazões, tratamento de água e toda e qualquer medida que mantenha o sistema funcionando.

Este plano se insere nos investimentos de R$ 1,1 bilhão que a Sabesp passou a realizar, sobretudo na contenção de vazamentos de água. A ideia por trás da contingência é que a otimização da distribuição e de toda a infraestrutura seriam suficientes para manter o sistema funcionando no volume morto até o reestabelecimento das chuvas.

O racionamento é tratado como uma solução precipitada, mesmo se for organizado de maneira exemplar.

“O Plano de Contingência II está, então, evitando que a população seja submetida ao rodízio e aos malefícios correspondentes à sua implementação, cujos mais impactantes são os riscos à saúde pública devido às pressões negativas às quais as redes ficam submetidas”. O documento conclui que, além da diminuição da qualidade da água, o corte no fornecimento mobilizaria um contingente grande de mão de obra que a Sabesp deveria evitar para investir na melhoria da infraestrutura.

Em janeiro de 2015, mais de seis meses depois, Dilma Pena disse que ordens diretas do governo Alckmin evitaram falar sobre a falta de água. Paulo Massato falou para os paulistanos deixarem sua cidade natal. Os dois áudios vazaram de reuniões internas da Sabesp.

“Falta de transparência”

Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi aprovada na Câmara dos Vereadores em 6 de agosto de 2014. Nelo Rodolfo (PMDB) e Ari Friedenbach (PROS) assumiram a relatoria e vice-presidência, respectivamente, do grupo de políticos que investiga irregularidades da Sabesp. Outros nomes que estão fazendo requisições à empresa são Nabil Bonduki (PT) e Laércio Benko (PHS).

Bonduki se licenciou no dia 3 de fevereiro para assumir a Secretaria Municipal de Cultura, no lugar do novo ministro Juca Ferreira. No entanto, o então vereador deixou um documento sobre suas contribuições para a CPI que dão um panorama sobre as ingerências da Sabesp. O DCM teve acesso exclusivo ao arquivo.

“A crise é resultado de uma combinação de fatores: gestão tradicional de água com foco em obras de ampliação de demanda, degradação de mananciais e aumento de consumo; pouco espaço de participação da sociedade e falta de transparência da gestão da água; seca extrema e déficit de chuvas, em especial no sistema Cantareira”, explicou Nabil Bonduki.

Com formação em arquitetura e urbanismo, Bonduki é doutor em estruturas ambientais urbanas pela Universidade de São Paulo (USP) e fala com propriedade sobre o conjunto de fatores que levaram a Sabesp a chegar próximo do colapso de sua principal reserva hídrica.

Este documento da CPI frisa que o programa de redução de perdas de vazamentos não atingiu o resultado esperado. Bonduki também caracteriza como “sistêmica” a atitude da Sabesp em buscar outras reservas para repor estoques de águas, sem ter uma ação localizada para captar recursos das chuvas e de formas de reuso do líquido.

“Outro ponto importante é a falta de transparência por parte da Sabesp e do governo do estado sobre cortes de fornecimento de água, bem como a falta de articulação com outras instâncias de governos”, explica Nabil Bonduki.  O Ministério Público Federal (MPF) chegou a recomendar formalmente que a gestão Alckmin executasse, com a Sabesp, o racionamento de água publicamente. Essa ação não aconteceu desde o mês de janeiro de 2014.

O governo Alckmin é o maior acionista da companhia e, como o lucro é da  venda de volume de água, o rodízio não era uma alternativa interessante.

O problema é que essa decisão forçou um racionamento feito de forma velada, enquanto os cortes foram desconsiderados do planejamento. Nesta mudança de percurso, a ideia de “colapso hídrico” foi abandonada e voltou com a seca de janeiro na Cantareira, que fez o nível cair até 5%. Chuvas não esperadas em fevereiro fizeram a reserva subir para 10%.

Mas hoje se fala abertamente em começar um racionamento por temores de um colapso das reservas do sistema. A palavra proibida voltou a tona. Primeiro o governador Alckmin cogitou o mês de março para iniciar o processo de maneira pública. Hoje a iniciativa pode começar só na metade de 2015.

“As eleições de 2014 podem ser consideradas como um fator agravante para a crise de água em São Paulo, uma vez que as decisões mais radicais como racionamento e multa foram evitadas no período”, diz Nabil Bonduki. Alckmin foi reeleito no primeiro turno com mais de 12 milhões de votos.

“As pessoas terão disenteria”: diretor da Sabesp fala de rodízio e contaminação da água em SP

Postado em 25 fev 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/as-pessoas-terao-disenteria-diretor-da-sabesp-fala-de-rodizio-e-contaminacao-da-agua-em-sp/



“Nós estamos reduzindo a pressão do fornecimento de água e isso já é racionamento. Reduzir o consumo é isso. O que não temos ainda é um rodízio. Pode ser que algumas pessoas estejam bebendo água contaminada, mas prefiro pensar que isso ainda não aconteceu. E o que acontece durante uma contaminação de água? As pessoas terão disenteria e hoje temos medicina suficiente para minimizar riscos de vida”, admitiu o diretor metropolitano da Sabesp, Paulo Massato, em depoimento à CPI da Sabesp na Câmara Municipal nesta quarta-feira (25).

Massato foi convocado junto com o presidente da companhia, Jerson Kelman, para prestar esclarecimentos.

Em todo momento, o diretor e o presidente evitaram a palavra racionamento, até que Massato explicou que as tubulações da Sabesp estão sofrendo reduções de pressão e isso seria uma maneira de diminuir o consumo e o fornecimento em determinados horários sem interromper o funcionamento do sistema.

Kelman mostrou dados diferentes dos documentos apresentados por sua antecessora no cargo, Dilma Pena, em 2014. Para ele, as perdas de água em vazamentos caíram, desde 2004, de 40% para 29%. Os dados destoam de relatórios anteriores que apontavam para uma perda de 36% dos recursos hídricos em tubulações.

O executivo, que já trabalhou na Light do Rio de Janeiro, também enfatizou que o programa de bônus por economia de consumo, anunciado por Geraldo Alckmin em fevereiro do ano passado, produziu resultados para 2015.

Tanto Jerson Kelman quanto Paulo Massato descartaram a instituição de um rodízio a ser iniciado entre os meses de maio e agosto deste ano porque a Sabesp acredita que terá as obras prometidas pela gestão Alckmin para otimizar a captação e a distribuição de água.

No entanto, se o racionamento ocorrer num rodízio, com fechamento das tubulações, podemos esperar ter dor de barriga.

Massato chegou a ser questionado pelo DCM sobre a falta de obras para estancar vazamentos, que envolvem o nome dele na formação de um suposto cartel de fornecedores de acordo com denúncia recebida pelo Ministério Público. O diretor, no entanto, não respondeu às perguntas.

Mais de R$ 160 milhões em obras sem licitação

O promotor Otávio Ferreira Garcia investiga os contratos feitos pela Sabesp depois do início da crise hídrica, decretada em janeiro do ano passado. Garcia fez um questionamento: “O montante que apuramos em nosso inquérito civil é de R$ 160 milhões nas obras emergenciais até o momento. Mas sabemos que a cifra já está maior”, afirmou.

“Segundo nossas investigações, o valor chegou até R$ 180 milhões em outubro do ano passado”, disse Garcia. De acordo com fontes da CPI consultadas pelo DCM, o valor já estaria em R$ 300 milhões em iniciativas que surtiram pouco efeito no colapso hídrico.

O final da audiência foi marcado por discussões prolongadas entre vereadores e os dirigentes da Sabesp sobre a falta de água em comunidades carentes como o Capão Redondo. Entre os questionamentos, a CPI perguntou o que a população deveria fazer caso falte água em escolas.

“Teremos problemas, alguns graves, mas nada que não tenha sido visto antes. Não devemos exagerar, mas a população será avisada com antecedência”, disse o presidente Kelman.

A julgar pela desinformação generalizada desde o início da crise, é muito pouco provável que isso ocorra.

“A Sabesp não deveria ter aberto ações”: um diretor da empresa evidencia a confusão do governo de SP

Postado em 26 fev 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-sabesp-nao-deveria-ter-aberto-acoes-a-sinceridade-de-um-diretor-da-companhia-e-a-confusao-no-governo-alckmin/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.


Wanderley da Silva Paganini é superintendente de gestão ambiental da Sabesp e compareceu nesta quinta-feira (26) junto com outro funcionário, Marco Antonio Lopes Barros, para prestar esclarecimentos no Ministério Público Federal de São Paulo.

Paganini teve um ataque de sinceridade. “Eu acho que a Sabesp não deveria ter aberto ações em bolsa. Infelizmente posso perder meu emprego por ter dito isso, mas acho que temos obrigação de prestar esclarecimentos à sociedade”, disse.

Depois contemporizou: “A entrada no mercado financeiro evitou que a empresa fosse totalmente vendida”. O fato é que, embora a empresa se comporte como uma instituição privada visando aumentar lucros e distribuir dividendos, ela ainda é uma empresa de capital misto.

Não é privada e não é pública, embora o acionista majoritário seja o governo do estado de São Paulo. A gestão Alckmin nomeia as principais diretorias e até de sua agência reguladora, que deveria ser independente, a ARSESP.

Na manhã do último dia 25 de fevereiro, o novo presidente da Sabesp, Jerson Kelman, tentou explicar aos vereadores da CPI os motivos que envolveram a abertura de ações no mercado financeiro. “A empresa fez isso justamente para conseguir investimentos mais sustentáveis para suas obras, que exigem uma grande captação e um corpo técnico qualificado para sua execução”, afirmou.

Tomou uma invertida de Laércio Benko, vereador pelo PHS e presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito. “Eu discordo de maneira elegante de suas declarações. Na minha opinião a água é um bem fundamental e não um produto comercializável. Vocês confirmam que a Sabesp tem tratado do tema como um produto?”

Bateção de cabeça

A crise hídrica evidencia a falta de rumo do governo e seu descontrole com relação à companhia. Numa visita a uma estação de tratamento, o diretor metropolitano Paulo Massato abriu novamente o jogo: “O cálculo conceitual, teórico, para reduzir 15 metros cúbicos por segundos no Cantareira precisaria de um rodízio de dois dias com água por cinco dias sem água”.

Geraldo Alckmin, presente no local, tentou distrair os repórteres, declarando que a oferta de água para a área da Grande São Paulo foi aumentada em 500 litros por segundo. De acordo com o governador, isso só foi possível com a transferência de água do córrego Guaratuba para o Sistema Alto Tietê.

A tática de Alckmin para distrair a imprensa virou piada entre os jornalistas que cobrem a história. Na reunião da CPI, Massato voltou a falar do rodízio de cinco dias sem água por dois com abastecimento. O diretor da Sabesp disse que isso não seria mais necessário com o aumento do nível da Cantareira para 11% e a economia dos usuários.

Em agosto de 2014, depois da adoção do volume morto na Cantareira, o Instituto Trata Brasil informou que a Sabesp perde 36,3% de fornecimento de água nas encanações, com base em dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS).

O presidente Jerson Kelman contestou esses dados na CPI, mostrando que, entre 2004 e 2014, as perdas de água foram reduzidas de 40% até 29%. “Então podemos esquecer as informações que foram divulgadas pela ex-presidente Dilma Pena?”, perguntou o vereador Laércio Benko. Kelman não respondeu.

A Sabesp iniciou um Programa de Redução de Perdas da Sabesp entre 2008 e 2012. A iniciativa saiu pelo custo de R$ 1,1 bilhão em contratos. Em depoimento à CPI, Jerson Kelman e Paulo Massato afirmam que todas as obras necessárias para manter as tubulações funcionando foram realizadas e a empresa estaria em produção recorde de água se não existisse a estiagem recorde no sudeste brasileiro.

Água como mercadoria

A abertura de ações da empresa no mercado financeiro é no mínimo controversa. Ela gera investimentos, altos lucros e dividendos para a iniciativa privada, mas carece de obras que poderiam ter atenuado os efeitos da seca no sistema Cantareira.

A destruição de reservas das mananciais, por ações predatórias da sociedade ou da população desinformada que ocupa áreas que deveriam ser proibidas, aumentaram os efeitos da seca diminuindo a capacidade de captação hídrica da Cantareira.

Esse argumento é reforçado pelo advogado especialista em saneamento Vladimir Pinheiro, que já foi entrevistado pelo DCM. “O faturamento da empresa está vinculado à água que ela vende. Até o esgoto é incluído no mesmo cálculo”, disse Pinheiro, um dos responsáveis pela elaboração da Lei Federal de Saneamento Básico.

As críticas ao modelo de negócio da Sabesp endossam o comentário sincero do superintendente Wanderley da Silva Paganini, que é especialista em gestão ambiental. Se o capital privado arrecadado pela companhia fosse utilizado para melhorar a qualidade de seu serviço de fornecimento de água, com uma agência independente que a fiscalizasse – o que não é o caso da ARSESP -, a empresa poderia ter feito um bom gerenciamento privado.

“A corrupção da Sabesp chega a ser comparável com a da Petrobras”: o presidente da CPI da Sabesp fala ao DCM

Postado em 01 mar 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/com-o-pt-seria-a-mesma-coisa-laercio-benko-presidente-da-cpi-da-sabesp-fala-ao-dcm/

O presidente da CPI da Sabesp, Laércio Benko (PHS), tem 41 anos, é advogado especialista em Direito Tributário, atuou no Partido Verde (PV) e foi vice-presidente da legenda durante a campanha de Marina Silva à presidência.


Após a derrota de Marina, filiou-se ao PHS. É umbandista há oito anos por conta de sua mãe e defende a liberdade religiosa entre políticos. Conversamos com ele sobre a crise hídrica em São Paulo e a atuação do governo na Sabesp.

A CPI tem chances de dar resultado?

A CPI fez pelo menos 200 requerimentos, entre Sabesp, ARSESP (Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo), Agência Nacional de Águas (ANA), Prefeitura de São Paulo e Ministério Público. Ou seja, nós temos um trabalho documental grande e vamos terminar no dia 28 de maio com um relatório útil para identificar problemas, apontar responsáveis, para que isso que está acontecendo seja minimizado e nunca mais volte a acontecer.

Vocês estão lidando com que tipos de denúncias?

Temos várias denúncias protocoladas no MP ou dirigidas diretamente para a gente, de todos os tipos. Elas variam muito, de vazamentos até esgoto clandestino. Há quem fale que a própria Sabesp despejou dejetos na represa do Guarapiranga através de uma estação elevatória de esgoto que não funciona direito. Condomínios populares ilegais instalados na beira de represa e também moradores que recebem ar no lugar da própria água. E eles são cobrados financeiramente pelo ar. Essas são alguns fatos que se tornam queixas à Sabesp diante da comissão.

Como está a questão do vazamentos de água, alvo de denúncias pesadas? 

O percentual de 30% de perdas é o mesmo desde 2004, há 10 anos. Dentro deste número, 20% escapam por vazamentos e 10% por furtos. A Sabesp não investiu nas perdas, porque para eles ficava mais caro consertar do que deixar vazar. Ou seja, se tratou água como um produto, não como um bem estratégico. Nós vimos pela imprensa que o Japão tem 2% de perdas hídricas e eles querem diminuir mais ainda. Aqui nós temos 30% e a Sabesp não quis esvaziar o bolso dos acionistas em Nova York e deixou esvaziar o reservatório da Cantareira.

A situação deve permanecer assim por muito tempo?

Estou otimista quanto ao trabalho da comissão porque acredito que a crise será prolongada. Infelizmente viveremos tempos difíceis nos próximos dois ou três anos. Isso fará com que todas as autoridades se envolvam com o problema. O envolvimento será profundo para que isso nunca mais volte a acontecer.

Pensando na participação privada e na gestão do governo do estado dentro da Sabesp, de quem foi a maior culpa neste perigo de colapso?

Esse problema foi uma soma de todos os fatores, públicos e corporativos. Eu, pessoalmente, jamais privatizaria a Sabesp e jamais abriria ações dela na bolsa de valores. Não tenho nada contra isso, e sou favorável a participação da livre-iniciativa em vários setores. Mas água é a área mais estratégica de qualquer Estado. Se você quer acabar com o país, acabe com a sua água. Isso não pode ser objeto de especulação financeira ou lucro. A água faz parte da nossa sobrevivência. Foi um desvio de conduta o que foi feito com a Sabesp, além do governador Geraldo Alckmin tentando passar uma falsa sensação de segurança em 2014.

Você acredita que o problema da Sabesp é a gestão do PSDB?

Não vejo tanta diferença entre o PT e o PSDB. A corrupção da Sabesp chega a ser comparável com a da Petrobras. Acho que, se um partido estivesse no lugar do outro, ainda assim teríamos problemas. É tudo a mesma coisa.

O mistério de Mario Covas Neto, o vereador da CPI da Sabesp que culpa São Pedro pela falta d’água

Postado em 06 mar 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-misterio-de-mario-covas-neto-o-vereador-da-cpi-da-sabesp-que-culpa-sao-pedro-pela-falta-dagua/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.


Mario Covas Neto tem 55 anos e é filho do ex-governador Mário Covas Júnior, morto em 2001 devido a um câncer na bexiga. Formado em Direito pela Universidade Mackenzie de São Paulo, atuava na área de campanhas eleitorais do pai desde 1986, mas só começou a ocupar cargos na prefeitura de Caraguatatuba, como secretário, entre 2010 e 2011. Elegeu-se vereador em São Paulo em 2013 com mais de 60 mil votos.

Conhecido pelo apelido “Zuzinha”, ele é aficionado por corrida e já entrou em categorias como Stock Car, Kart, Fórmula Ford e Fórmula Fiat.

Dentro da CPI da Sabesp na Câmara Municipal, Mario Covas Neto trabalha como rede de proteção da companhia e do governador Geraldo Alckmin, eventualmente num papel ridículo. Em agosto de 2014, chegou a dizer que o real culpado pelos transtornos era São Pedro.

O DCM teve acesso exclusivo a um relatório de uma reunião organizada pela CPI em 17 de setembro de 2014. Em uma discussão com o então vereador Nabil Bonduki, atual secretário de Cultura da Prefeitura, Zuzinha contesta o uso particular de uma área de moradias populares chamada Nova Palestina, na estrada do M’Boi Mirim e nas mananciais da represa da Guarapiranga, e faz acusações ao governo do petista Fernando Haddad e ao Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST).

“Eu só acho que, na minha visão, há uma admiração pelo MTST por parte da Prefeitura, um esforço grande no sentido de preservar este movimento e dar força a este movimento, inclusive estimulando para que se invada áreas que são de proteção das mananciais”, acusou.

Estivemos em uma assembleia pública da CPI da Sabesp na Câmara no dia 24 de fevereiro. Covas Neto acusou o Partido dos Trabalhadores de fazer “uma torcida” para que a situação do sistema Cantareira piore. “A briga com o PT é da política, mas disseram que durante a campanha que o rodízio estava acontecendo e o que ocorreu foi uma diminuição da pressão da água nas tubulações”, afirmou, defendendo a Sabesp.

Na opinião do vereador, a empresa tomou todas as providências para se preparar para a maior seca no sudeste brasileiro desde o século passado.

Questionado pelo DCM sobre a falta de monitoramento nas perdas de água, ele culpou os consumidores. “Há perdas não são nem culpa da Sabesp, resultado de gatos feitos pela população para ter o recurso”, afirmou.

O DCM também teve acesso aos documentos do projeto de lei que deu origem à Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (ARSESP). A instituição foi criada como uma Lei Complementar 1.025 no dia 7 de dezembro de 2007, assinado pelo então prefeito Gilberto Kassab.

A diretoria da ARSESP é nomeada pelo governo estadual e seu papel é fiscalizar a atuação da Sabesp. Ao contrário do que Covas Neto afirmou, não é da prefeitura a responsabilidade pela preservação da região de mananciais. Pelos contratos firmados entre município e governo, há atribuições próprias para a agência reguladora.

No segundo artigo do projeto de lei da ARSESP, há a seguinte atividade que deve ser responsabilidade da instituição: “A proteção de mananciais em articulação com os demais órgãos do Estado e do Município de São Paulo”.

Hoje, restam apenas 488 quilômetros quadrados, ou 21,5%, de vegetação nativa na bacia hidrográfica e nos 2270 quilômetros quadrados do conjunto de seis represas que formam o Sistema Cantareira, de acordo com a ONG SOS Mata Atlântica. A destruição das reservas de mananciais diminuíram a capacidade de captação de água das chuvas, sendo este um dos fatores de ingerência da Sabesp que resultou na seca das reservas locais.

Mario Covas pai foi governador de São Paulo entre 1995 e 2001. De acordo com a Folha de S.Paulo e o Estadão de novembro de 2008, o filho Covas Neto foi citado pelo Ministério Público na investigação de suposto superfaturamento de R$ 37,7 milhões em contratos firmados em 1996 pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) com empresas de segurança.

Ele teve o sigilo quebrado pelo juiz Randolfo Ferraz de Campos em setembro daquele ano. No entanto, seu advogado na época, Áttila Sipos, obteve liminar do desembargador Osvaldo de Oliveira, da 12.ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça, que derrubou a medida e restabeleceu seus dados confidenciais.

Mario Covas Neto disse que a promotoria quis submetê-lo a “constrangimentos”. Ele afirmou no Twitter que é um dos autores do projeto que prevê advertência e multa de R$ 250 para quem lavar calçada com água tratada. A lei deve ser regulamentada em dois meses, com atuação da Prefeitura de São Paulo e da Sabesp. A primeira denúncia do infrator rende apenas uma notificação. Na segunda informação, vem uma multa de R$ 250. Caso haja reincidência, será cobrado o valor de R$ 500.

A população, seguindo o plano de bônus proposto pelo governador Geraldo Alckmin, conseguiu poupar 3683 litros por segundo em 2014. Posteriormente, a Sabesp diminuiu a pressão dos canos, gerando um racionamento forçado que poupou 6355 litros por segundo, ou 72% de água a mais preservada.

A maior parte do consumo hídrico fica em 92% da distribuição pertencentes ao agronegócio e à indústria. O povo fica com apenas 8% da fatia. Covas Neto acredita que devemos economizar e ser multados caso desperdicemos água. A Sabesp e o governo do estado não têm nada a ver com isso. É um caso exemplar do casamento entre a mediocridade e a cara de pau.

Por que Abril e Globo são clientes “premium” da Sabesp e têm gordos descontos?

Postado em 10 mar 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/por-que-abril-e-globo-sao-clientes-premium-da-sabesp/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.


O jornal El Pais divulgou nesta terça-feira (10) uma lista de 537 clientes que recebem até 75% de desconto no uso de sua água fornecida pela Sabesp. São grandes empresas, como o McDonald’s, indústrias e até a companhia de bebidas Bacardi. Entre elas, estão a Abril, a Globo, a Record e o portal UOL.

O Estadão estava originalmente na lista, publicada às 10h da manhã no El Pais. Ela foi atualizada com mais nomes às 17hrs do mesmo dia e o jornal sumiu. O texto divulgado pela Agência Estado não fala, obviamente, da primeira listagem.

Por qual motivo essas companhias ganham expressivos descontos, enquanto o cidadão comum paga cada vez mais caro e pode receber multas de até 250 reais por lavar a calçada?

Quarenta e dois clientes iniciaram seus contratos em 2014, quando a escassez no sistema Cantareira já havia acionado as cotas de volume morto. Ou seja, a Sabesp deveria ter evitado novos acordos com estes descontos, pois eles gastam 1,8 bilhão de litros e foram responsáveis pela alta de 5,4% no consumo anual.

As mais de 500 companhias recebem gordos descontos porque a Sabesp negocia seus contratos “no atacado”. O fornecimento leva em conta que um shopping com o porte de um Eldorado consome pelo menos 20 milhões de metros cúbicos de água para atender um público 1,8 milhão de pessoas por mês, um valor muito superior aos 15 mil litros consumidos por uma família de quatro pessoas no mesmo período de tempo.

O cliente pessoa física é tratado como se estivesse “no varejo”, com uma tarifa proporcionalmente maior.

Os critérios para escolha dos clientes “premium” são técnicos, de acordo com a Sabesp. Por que praticar estes preços? Para manter a alta lucratividade em cima da venda de grandes volumes. Se grandes grupos pagassem os mesmos R$ 13,97 do consumo doméstico, teriam que racionar água, diminuindo o consumo e balançando o faturamento da empresa que é fornecedora de recursos hídricos do estado de São Paulo.

Com isso, provavelmente a população teria níveis hídricos mais confortáveis para enfrentar a estiagem que foi forte em 2014 e que deve voltar neste ano.

O ex-presidente por trás dos contratos

Gesner Oliveira tem 58 anos, é economista pela FEA-USP e doutor pela Universidade da Califórnia. Ele tem história no setor público como secretário adjunto da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda de 1993 a 1995, como secretário interino de acompanhamento econômico do Ministério da Fazenda, também em 1995 e como presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) entre 1996 e 2000. Foi presidente da Sabesp entre 2007 e 2010, quando formalizou os contratos de demanda firme.

Oliveira chegou a afirmar, em fevereiro, que a Sabesp já deveria ter suspendido o privilégios dos “premium”.

O DCM obteve acesso exclusivo a uma apresentação feita por Oliveira à Câmara dos Vereadores para a CPI da Sabesp. No documento apresentado no dia 5 de novembro de 2014, chamado “Futuro da água: uma agenda para a sociedade civil e diferentes esferas de governo”, ele pede que a sociedade e o governo mudem radicalmente de comportamento em relação à água no mesmo documento, sem mencionar as empresas. Atualmente, atua como consultor privado em negócios que incluem o setor de gestão hídrica.

Conflito de interesses

Há um conflito claro de interesses na maneira como a crise é coberta pelos veículos dos dois grupos de mídia incluídos na lista “premium”. Não se trata apenas de alinhamento “ideológico”.

A Abril, através de suas revistas, não atribui qualquer responsabilidade ao governador Geraldo Alckmin, enquanto a Globo mantém seus jornalistas focados na questão da seca do sudeste, sem fazer questionamentos sobre a atuação da empresa fornecedora de água.

O site da Veja não noticiou as demissões recentes dentro da Sabesp, o que era de se esperar, mas a Exame dá destaque à ameaça de greve dos sindicalistas e à baixa das ações. Eventualmente, publicações segmentadas da Abril relatam contaminação durante a crise hídrica.

O UOL foi até a represa Atibainha, em Nazaré Paulista, fotografar o carro que se tornou símbolo da seca no Cantareira, mas dá manchetes animadas quando ocorrem chuvas, sendo que o nível das represas não superou nem a segunda cota do volume morto. Já a Record faz uma cobertura parecida com a da TV Globo, atenta à seca mas pouco crítica.

O Fantástico conseguiu ir a Itu contar o drama da cidade e em nenhum momento citou o nome de Alckmin ou de alguma outra autoridade estadual. Não apareceu em cena sequer a famosa frase “entramos em contato com a assessoria do governador Geraldo Alckmin, mas ele não quis responder”.

Falta água, mas uma mão lava a outra.

Como os malfeitos da Sabesp se interligam com os escândalos do Trensalão e da Petrobras

Postado em 16 mar 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/como-os-malfeitos-da-sabesp-se-interligam-com-os-escandalos-do-trensalao-e-da-petrobras/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.



A crise da falta de água em São Paulo por causa do colapso da Sabesp se conecta com outros dois casos de corrupção: o trensalão e o escândalo da Petrobras. São histórias que se entrelaçam e que ajudam a entender melhor a corrupção no Brasil e seus protagonistas.

Do início: em julho de 2013, um mês depois que as manifestações explodiam nas ruas, o escândalo do chamado “trensalão” começou a aparecer na imprensa. O PSDB estava envolvido no maior escândalo de propinas no transporte público com três nomes importantes: Mario Covas, José Serra e Geraldo Alckmin.

Duas empresas, a francesa Alstom e a alemã Siemens, formaram um cartel sem concorrência na construção das linhas do metrô.

As informações começaram a se tornar públicas graças a uma reportagem da Carta Capital de 2009, do jornalista Gilberto Nascimento, e o trabalho de um repórter americano chamado Bryan Gibel, da Universidade de Berkeley, que conversou com um ex-executivo da Siemens.

Entre todos os ex-governadores tucanos, é José Serra que mais aparece nas denúncias de formação de cartel, de acordo a Istoé. Serra teria pressionado empresas a anular decisões em licitações para manter as contratações com o consórcio Alstom-Siemens, mesmo envolvendo subcontratações.

O Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo arquivou, no dia 14 de outubro de 2014, o inquérito com acusações ao ex-governador José Serra. A decisão foi de cinco votos a três. Pelo arquivamento, votaram os conselheiros Motauri Ciochetti de Souza, Mário Luiz Sarrubbo, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, Martha de Toledo Machado e Álvaro Augusto Fonseca de Arruda. Contra o arquivamento, votaram o relator, Sérgio Neves Coelho, José Oswaldo Molineiro e Pedro de Jesus Juliotti.

A denúncia consta em investigações do promotor Marcelo Milani. Ele também é responsável, atualmente, por investigar a formação de outro cartel dentro da Sabesp, na área de vazamentos de água, supostamente facilitados pelo diretor metropolitano Paulo Massato.

São oito companhias que venceram 42 licitações em projetos de gestão hídrica: BBL Bureau Brasileiro, Sanit Engenharia, Enops Engenharia, B&B Engenharia, Opertec Engenharia, Cobrape Companhia Brasileira de Projetos, Estudos Técnicos e Projetos ETEP e Restor Manutenção de Equipamentos Eletromecânicas.

Coincidência o mesmo promotor do Ministério Público estar no caso da Sabesp? Nada é por acaso e existem pontos em comum entre o trensalão e o risco de colapso hídrico do sistema Cantareira.

Denúncias que unem a Sabesp a outros escândalos

O Ministério Público do Estado de São Paulo abriu três investigações dentro da operação Lava Jato para verificar obras da Sabesp, a construção da estação Vila Prudente do metrô de São Paulo e projetos de refinarias da Petrobras. As apurações estão baseadas em uma tabela de 34 páginas com 747 obras do doleiro Alberto Youssef, apreendida em março de 2014.

As investigações foram pedidas pelo promotor de Justiça Sílvio Marques da divisão de Patrimônio Público.

Essas ações do MP estão em conjunto com ações já estabelecidas com a Sabesp, incluindo um inquérito que apura as obras emergenciais da empresa responsável pelas reservas hídricas. O Ministério Público apurou que pelo menos R$ 160 milhões foram gastos em obras sem licitações públicas e a investigação deste inquérito mais antigo aponta que a quantia de dinheiro por ser maior.

Nestas três investigações deste ano, a Sabesp é questionada sobre a implantação da estação de tratamento de água Jurubatura, no Guarujá;  a obra aduladora Guarau-Jaguará, na área da Grande São Paulo; e a tubulação de Franca. Os promotores encontraram no documento o valor de R$ 28,8 milhões em propina para a empresa controlada pelo governo do estado de São Paulo, atualmente sob a gestão de Alckmin.

O metrô teria desviado R$ 7,9 milhões das obras na Vila Prudente. Já a Petrobras é citada em 90 projetos ligados à Refinaria de Paulínia (Replan), Refinaria Capuava (Recap) da região metropolitana e Refinaria Henrique Lage (Revap) de São José dos Campos. Todos os dados destas novas denúncias envolvem o estado de São Paulo.

A presença do cartel do metrô na lista de clientes da Sabesp

Na lista de 537 clientes “Premium” divulgada pelo jornal El País, as empresas Alstom e Siemens foram mencionadas. As duas empresas superfaturaram obras do metrô de São Paulo em pelo menos 30% e o Ministério Público concluiu, junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), que a sociedade foi lesada em pelo menos R$ 425 milhões em licitações realizadas em mais de 20 anos pelas duas empresas.

Tanto a Alstom quanto a Siemens foram beneficiadas, como empresas da lista “premium”, com descontos de até 75% no preço de suas contas de água. Do preço de R$ 13,97 por metro cúbico de água, a Sabesp chegou a cobrar apenas R$ 3,5 das grandes corporações do metrô. Em reuniões de diretores da Sabesp com a CPI na Câmara de São Paulo, não foi mencionado em nenhum momento uma mudança desses contratos, embora o ex-presidente Gesner Oliveira tenha defendido uma revisão em fevereiro de 2015.

O preço praticado com as empresas do consórcio do metrô é no atacado, enquanto o consumidor final paga pela água no varejo, ou seja, um valor maior. É cobrado desde 2014 que a população economize água, no programa de bônus da Sabesp, mas nenhuma mudança na contratação empresarial foi apresentada pela empresa em audiências na CPI montada na Câmara Municipal.

Como os paulistanos já estão pagando pelas dívidas da Sabesp

Postado em 21 mar 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/como-os-paulistanos-ja-estao-pagando-pelas-dividas-da-sabesp/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.


Cada vez que a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) se pronuncia sobre a crise hídrica, lança mais trevas ao invés de luz nas informações. E agora é a população da capital paulistana que começa a pagar a conta do rombo.

O governo do estado de São Paulo assumiu no dia 19 de março que pagará R$ 1,012 bilhão de uma dívida histórica.

Este valor é referente aos benefícios de aposentadoria e previdência entre os anos de 1986 e 2001 de antigos funcionários das seis estatais que compõem a Sabesp, fundada em 1973.

O pagamento de dívidas, no entanto, não é nada transparente. Fontes consultadas pelo jornal O Estado de S.Paulo afirmam que a receita da empresa fornecedora de água terá uma queda de cerca de R$ 1 bi. Ou seja, o dinheiro das aposentadorias seria conveniente num momento de rombo nas contas.

A queda no balanço a ser anunciado no dia 26 de março casa com as cobranças que a Sabesp está fazendo de três cidades em São Paulo: Guarulhos, Mauá e Santo André. A empresa quer R$ 3 bilhões. De acordo com Rubens Naves, o advogado da Sabesp no processo,  Garulhos não paga suas contas de água, Mauá deposita valores irrisórios e Santo André paga um quarto das cobranças.

A Sabesp atualmente possui duas acusações de crimes corporativos pesados no Ministério Público: de formação de cartel no setor de vazamentos de água e de obras emergenciais irregulares. Essas investigações estão sendo feitas no MP num total de seis inquéritos. Novas frentes de apuração do órgão podem se abertas.

As obras emergenciais serão feitas sem licitação pública. Se elas tivessem sido realizadas antes, em 2003, quando a crise hídrica foi ventilada, concorrências públicas poderiam ter sido abertas de maneira regular. Na atual situação, é grande a possibilidade de que empresas que já venceram as licitações ganhem dinheiro com projetos caros e de curto prazo.

O valor dos projetos também seria reduzido em obras de longa duração.

Com toda essa situação, o valor bilionário que o governo de Alckmin vai pagar sairá do bolso do contribuinte, do tesouro estatal. E os principais beneficiados, no risco de colapso da Cantareira, são justamente as empresas privadas que estão envolvidas em supostos escândalos e não enfrentarão concorrência pública.

Mas o problema não fica apenas no rombo financeiro. Ela se estende nos dados difundidos durante a crise da Sabesp.

Dados imprecisos

O sistema Cantareira está com 15,6% do seu nível ou caiu para o patamar de 12%? Os vazamentos de água no abastecimento hídrico são de mais de 30%, 29% ou 17%? Por que a Sabesp divulga números tão diferentes ao longo de sua crise hídrica, que pode provocar um colapso de gestão, desde janeiro de 2014?

Sob comando de Dilma Pena, no auge da crise em 2014, quando a empresa estava prestes a decretar o uso do volume morto, divulgou-se que 31,2% da água do estado de São Paulo foi perdida em vazamentos dos encanamentos. O volume equivale a 981 bilhões de litros ou quase uma Canteira inteira.

No mesmo levantamento, 51% dos canos de abastecimento, que atingem bairros como Perdizes, Moema, Tatuapé e Sé na cidade São Paulo, possuem mais de 30 anos de uso. Tóquio, no Japão, é uma das cidades que menos desperdiça água no mundo, na faixa de 2%. Sua manutenção de tubulações é feita preventivamente, no caminho oposto ao da Sabesp que só faz trocas quando os componentes apresentam problemas.

O diretor metropolitano Paulo Massato Yoshimoto contestou essa informação sobre os encanamentos japoneses, dizendo que em medidas internacionais, eles poupam 7% da água e não 2%. “Mesmo assim, é um bom índice”, disse o engenheiro da Sabesp em audiência na CPI no mês de fevereiro.

Os dados chamaram atenção em abril do ano passado. Quatro meses depois, o Instituto Trata Brasil divulgou que em 2012 a perda foi ainda maior, de 36,3%. Ou seja, na verdade a situação das tubulações estaria melhorando, mesmo com a crise e a estiagem que castigava a maior reserva hídrica da Sabesp.

Dilma Pena disse que recebeu “ordens superiores” para não divulgar informações sobre a crise da empresa e Paulo Massato disse que se a seca continuasse no sistema Cantareira, era melhor que saíssemos de São Paulo. No fim de 2014, a presidente saiu, para a entrada de Jerson Kelman, e Massato teve a sorte de ter chuvas atípicas nos meses de fevereiro e março de 2015. No fim, ninguém precisou fugir de São Paulo.

O novo porta-voz

Jerson Kelman tem 66 anos, é Ph.D. em Hidrologia e Recursos Hídricos pela Colorado State University, além de ter atuado como professor. Na audiência que participou na CPI da Sabesp, no dia 25 de fevereiro, Kelman apresentou muitos dados.

Em um gráfico sobre a estimativa dos vazamentos de água, a Sabesp mostrava que as perdas haviam sido reduzidas de 40% em 2004 para 29% em 2013.

Mas qual dado estava certo? As estimativas de Dilma Pena ou do novo presidente Jerson Kelman? Por que os dados apresentaram diferenças?

Também foi comentado dentro da CPI como Kelman defendia com muita tranquilidade a falta de necessidade de rodízio, um racionamento mais pesado. As falas do novo presidente iam completamente de encontro oposto aos de Dilma Pena, que apontava para um cenário muito mais catastrófico em 2015 pela falta de chuvas.

O diretor metropolitano Paulo Massato fornecia dados para que Jerson Kelman fizesse a defesa da empresa. Um reportagem da revista Época, ele é descrito como o “homem das gambiarras da Sabesp”. Engenheiro com 32 anos de empresa, essa descrição se encaixa com as decisões que ele tomou sem consultar ninguém, como a redução da pressão nos canos, provocando um racionamento parcial em determinadas localizações, e o uso da duas cotas do volume morto da Cantareira.

Ele tomou essas decisões com aval completo do governador Geraldo Alckmin, por ter um grande conhecimento técnico. Mas as decisões foram, de fato, as melhores?

O que o texto da revista não mencionou é que Massato possui uma acusação no Ministério Público de facilitar a atuação de um cartel de empresas no setor de vazamentos da Sabesp. O especialista em gambiarras é outro personagem, além do novo presidente, que confunde a população ao prestar esclarecimentos, embora Paulo Massato seja dono de uma sinceridade até perturbadora em coletivas de imprensa.

Nível da Cantareira que desceu nos dados oficiais

Chuvas atípicas nos meses de fevereiro e março ergueram o nível da Cantareira de 5% em janeiro para o atual nível de 15,6%. A Sabesp então passou a divulgar, a partir do dia 17 de março, as estatísticas desconsiderando o uso das duas cotas de volume morto dos reservatórios, água que fica abaixo das comportas de abastecimento.

A estatística caiu de 15,6% para 12%. O problema é que, anteriormente, a subida de nível da Cantareira era constantemente alardeada no noticiário brasileiro sem que essa diferença de mais de 3% no nível real do reservatório fosse mencionada.

As ações da Sabesp operam com o valor superior a R$ 18 e alta de 5% em alguns pregões da Bovespa. Pela alta dos papéis, alguém está ganhando dinheiro com a desinformação, porque um balanço negativo no final do mês pode derrubá-las, o que causará uma venda no mercado aberto.

Novas investigações

O promotor Ricardo Manuel Castro pode abrir novas apurações sobre improbidade administrativa da Sabesp na gestão da crise hídrica, de acordo com fontes ligadas à CPI. Otávio Ferreira Garcia já investiga as obras emergenciais na área de Patrimônio Público do Ministério Público, apurando se há desvios de valores milionários.

O que é possível entender do que ocorreu até agora é: A conta da crise da Sabesp chegou. O valor de R$ 1 bilhão sairá dos cofres públicos, portanto, da população, para pagar o rombo de investimentos que deveriam ter sido realizados há 12 anos.

A ineficiência da Sabesp, que está quase provocando um colapso do sistema Cantareira, não é ocasional. Ela vai gerar um ganho de capital enorme com as empresas que assumirem os projetos de curto prazo para solucionar a crise da água.

A corrupção, portanto, é um bom negócio corporativo dentro da empresa controlada pelo governo Geraldo Alckmin. E quem paga a conta é você.

Como a Sabesp perde R$ 200 milhões ao ano com descontos suspeitos de edifícios comerciais

Postado em 17 abr 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/como-a-sabesp-perde-r-200-milhoes-ao-ano-com-descontos-suspeitos-de-edificios-comerciais/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.


O condomínio São Paulo Head Offices está localizado na Rua Joaquim Floriano, número 72, no bairro do Itaim, um dos mais nobres da cidade. Reúne algumas firmas reconhecidas, como Promon e Ernst & Young.

Em 17 de março de 2015, a conta de água do lugar foi de R$ 12.603,89. Eles gastaram 1329 metros cúbicos. O valor correto seria de R$ 36 mil, mais ou menos. Ou seja, o edifício comercial deixou de pagar R$ 24 mil e é assim todo mês há vários anos. O desconto existe desde 2003. Qual é o motivo para contas tão baixas?

É um problema jurídico gerado por leniência da fornecedora de água, a Sabesp.

As contas vêm sendo reduzidas graças a liminares concedidas com base num decreto do governo estadual de 1983, reformado por outro de 1996. De acordo com dois ex-diretores ouvidos pelo DCM, essas decisões judiciais já deveriam ter sido cassadas há quase 20 anos. Por determinação da Justiça, tais reduções deveriam cessar em 1996.

O decreto nº 21.123 de 4 de agosto de 83, autorizado pelo governador André Franco Montoro, diferencia as tarifas entre imóveis residenciais, industriais, públicas e comerciais, mas sem atrelar formas específicas de cobrança e comunicando o proprietário até 10 dias antes. A norma nunca foi cumprida pela Sabesp com regularidade, gerando milhares de ações jurídicas contra a companhia.

Um segundo decreto foi divulgado em 16 de dezembro de 1996 no Diário Oficial. O documento 41446 repete os princípios da determinação de 1983, mas no governo do tucano Mario Covas, diferenciando o consumo de água apenas dentro das faixas de consumo em metros cúbicos.

Como o Head Offices, vários prédios comerciais entraram com processo na justiça e conseguiram altos descontos entre 1984 e 1996, que continuam valendo até hoje por causa de liminares.

Essa falta de monitoramento gera perdas milionárias. Dependendo do consumo de água, especialmente em regiões com prédios comerciais mais altos ou que desperdiçam grandes volumes de metros cúbicos, mais de R$ 100 milhões se esvaem.

O problema também ocorre por falhas técnicas e uma gestão errática. Em plena crise, a companhia anunciou que dará mais de 500 mil reais de bônus a seus executivos, enquanto estuda um reajuste de 22,7% na tarifa.

“Um prédio comercial que consome 3000 metros cúbicos de água, por exemplo, deveria pagar por volta de R$ 80 mil por mês. O que acontece é que várias contas de edifícios comerciais vêm com valor errado por falha em seu sistema de medição ou no acompanhamento jurídico de seus processos”, disse ao DCM um ex-diretor. Esse valor pode girar em torno de R$ 200 milhões anualmente.

A Sabesp estabeleceu que quem consumir até 20% a mais de sua média entre fevereiro de 2013 e janeiro de 2014 pagará uma sobretaxa de 40%. Se o montante ultrapassar 20%, a multa sobe para 100%.

“Multar o cliente agora, sendo residência ou edifício comercial e segundo parâmetros de 2013 não vai trazer a redução necessária de água. O ideal seria elevar a tarifa de água e estimular a economia do consumo como um todo. Pelo critério divulgado pela Sabesp, se eu tinha um edifício em construção há dois anos, eu posso ser multado hoje em 100% todos os meses porque os metros cúbicos de um prédio em funcionamento sempre vão superar o de uma obra”, afirma um outro executivo da Sabesp ouvido pelo DCM.

A empresa afirma que seus clientes podem contestar as multas que forem aplicadas através do site oficial. Inicialmente, a Sabesp divulgou que estudava aplicar uma taxa entre 20% e 50%, bem distante do patamar de 100%. Em março, a Câmara Municipal, incluindo vereadores que fazem parte da CPI da Sabesp, aprovaram uma multa de R$ 250 para quem lavar a calçada com água tratada, e mais R$ 500 para reincidentes na irregularidade.

Num documento a que tivemos acesso, um condomínio comercial que consome cerca de 2000 metros cúbicos de água teve uma conta de R$ 60 mil, no mês seguinte teve a sua conta zerada e, no terceiro mês, teve uma cobrança de R$ 46 mil. Outro edifício que consome cerca de 2000 m³ pagou R$ 58 mil em um mês, nada no mês seguinte e R$ 36 mil no terceiro.

“Catástrofe é a gestão da crise hídrica no governo Alckmin, não a crise”, diz o líder do coletivo Luta pela Água

Postado em 14 mai 2015 por : Pedro Zambarda de Araujo
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/catastrofe-e-a-gestao-da-crise-hidrica-no-governo-alckmin-nao-a-crise-diz-o-lider-do-coletivo-luta-pela-agua/

O coletivo Luta pela Água foi formado em janeiro de 2015 pela Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental (FNSA) e outras entidades, tanto de classe quanto dos movimentos sociais. É a entidade mais importante na luta contra os desmandos da Sabesp e do governo de SP na questão da crise hídrica.


Para entender melhor as reivindicações do grupo, o DCM conversou com o porta voz do grupo, Hamilton Mendes Rocha, produtor audiovisual e gerente do Caledoscopi Project.

Vocês acreditam nas previsões de que teremos um rodízio 5×2 neste ano?

O rodízio não é catastrófico em si. A catástrofe está realmente na falta de água para uma parte da população, enquanto outra sempre tem o recurso porque tem infraestrutura própria de armazenamento. Nos bairros de renda alta, mesmo que fechem a água na rua, as caixas d’água têm reserva para muitos dias.

Além disso, já existe suficiente sistema de armazenamento de água de reuso que reduz o impacto da carência de abastecimento na rua. A catástrofe está na ausência de distribuição pelo governo do estado de sistemas seguros de armazenamento de águas pluviais durante os meses de chuva para reduzir o consumo de reservatórios como cisternas.

A catástrofe está na falta de uma política de uso coletivo dos  poços artesianos e rios  subterrâneos  existentes em nossas  cidades. Há um estado de calamidade pública que vivemos de forma velada, cujo responsável é o governador Alckmin, blindado pela grande imprensa que o protege.

O que vocês acham da direção da Sabesp na crise? O diretor metropolitano Paulo Massato agiu de forma certa? E o presidente da empresa?

As declarações públicas do senhor Massato são irresponsáveis, alarmistas e sentenciam a população de baixa renda a pagar pelo desastre humano da falta de água causado pela política executada todos esses anos por este governo. Ele conhece há mais de 20 anos as necessidades de consumo de água de todo o estado de São Paulo.

Não estamos falando só de incompetência, mas má fé e política de privatização com objetivos exclusivamente mercantis e sem ter o mínimo de cuidado com as necessidades da população. Se não é assim, como explicar que a Sabesp, em vez de reter os lucros para realizar a proteção de mananciais, envia parte do seu lucro aos acionistas em plena crise e possível colapso?

Como  explicar as demissões de quadros técnicos importantes da Sabesp no momento  em que são mais necessários para solucionar os problemas existentes? Como explicar que, ao mesmo tempo em que impõe multas aos pequenos consumidores, a Sabesp oferece descontos aos  grandes consumidores de até 75%?

Vocês acham que o fato de a Sabesp ter capital aberto dificulta uma gestão genuinamente interessada na eficiência?

A decisão de abrir o capital da Sabesp é a principal responsável por esse estado de coisas atualmente. É a política de priorizar a rentabilidade da empresa a todo custo em detrimento de uma política de serviço público no fornecimento de água. Assim se suprimiu uma política de proteção de mananciais, criação de reservatórios alternativos, redução de perdas na distribuição, aumento da rede de tratamento de esgotos, melhora na capacitação de quadro técnico da empresa  e se aplicou uma  política de sucateamento da infraestrutura  existente, terceirização de serviços essenciais de manutenção e controle, além de uma redução de custos sem critérios mais sociais.

Na verdade, o argumento de que abrindo o capital se receberia  mais investimento  foi transformado em  desvio de lucro para acionistas. Depois o governo de Alckmin foi pedir dinheiro público federal para cobrir o prejuízo causado pela crise. É um escândalo! Desvio de dinheiro público em nome da rentabilidade de uma única empresa.

Qual o papel do governador Alckmin?

Alckmin é o principal responsável pela crise que para nós não é de falta de água, pois ela existe e não se esgota completamente. A crise é de gestão da Sabesp e de abastecimento da maior região metropolitana da América Latina que possui um dos maiores PIBs do planeta e, mesmo assim, carece de infraestrutura  de  abastecimento  de água e esgoto.

Isso acontece devido a uma política sistemática de negligências com os serviços públicos. O principal crime causado por Geraldo Alckmin é o de omitir informação à população e impedir  que órgãos importantes de participação social como  os  Comitês de Bacia tenham papel nas questões relacionadas a esta crise. Ele esconde e contradiz informações, veta a atividade dos órgãos de participação social e realiza uma campanha para responsabilizar a população nas consequências da falta de água.

Outro crime indefensável é o racionamento velado e seletivo que o governo estadual pratica, através da Sabesp, prejudicando principalmente uma  parcela social importante e com menos recursos da Região Metropolitana de São Paulo e Campinas. Se o governo decretasse Estado de Calamidade Pública e realizasse um racionamento  coletivo e não seletivo, além de ordenar o consumo de água potável, ele impediria a desigualdade social do consumo  de água que  está se impondo  com este caos de abastecimento.

E as obras necessárias para manter o sistema Cantareira? Estão sendo bem feitas ou não?

As obras que estão sendo feitas estão previstas há anos e não existe nenhuma medida realmente emergencial. A novidade é que estas obras milionárias estão sendo feitas sem licitação, portanto sem transparência e sem  controle público. Você confia  em um governo que se aproveita de uma crise como esta para fazer obras gigantescas? Será que ele não contratará seus  amigos?

Como vocês articulam ações pela proteção do recurso hídrico?

Temos  um  perfil  no Facebook em que postamos artigos e noticias relacionadas com a  questão da  água. Fazemos reuniões periodicamente com as várias entidades signatárias do nosso manifesto para definir  organização e linha de atuação em atividades próprias ou conjunta com outros  coletivos que se  constituíram a partir de 2014. Realizamos permanentemente um trabalho de  articulação com  ONGs, ambientalistas, técnicos, trabalhadores da Sabesp, movimentos  de moradia, sindicatos e partidos políticos.

Tem algo que eu não perguntei e vocês gostariam de falar?

O coletivo de Luta pela Água realizou um ato em frente à Secretaria de Assuntos Hídricos do Estado de São Paulo para entregar uma  pauta de reivindicações que  vários itens. Queremos decretar imediatamente Estado de Calamidade Pública; cancelamento dos descontos concedidos aos grandes consumidores; requisitar poços artesianos para uso comum e coletivo; implantar programa de cisternas e reservatórios coletivos junto às comunidades carentes e os equipamentos públicos; por fim, elaborar plano de  emergência com ampla participação popular.

A equidade no abastecimento deve ser realizado de modo a não mais penalizar somente aqueles que moram nas periferias sociais, privilegiando as regiões mais elitizadas da cidade. Além disso, há propostas de ações mais pontuais como a criação de um “Plano de Emergência”, envolvendo a distribuição de caixas d’água e a criação de um programa estadual de cisternas e reservatórios coletivos. Todos estão em andamento.

Queremos transparência na gestão, comunicação e informação à população. Paralelo a isso, o coletivo deixou claro que é totalmente contra os aumentos nas contas de água, aprovados no último período.

“Se tiver terremoto, as coisas ficarão graves": o presidente da Sabesp não parece perdido, ele está perdido

Por Pedro Zambarda de Araujo / Postado em 17 de maio de 2015
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/se-tiver-terremoto-as-coisas-ficarao-graves-o-presidente-da-sabesp-nao-parece-perdido-ele-esta-perdido/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.



O principal assunto da última sessão da CPI da Sabesp na Câmara de SP foi o aumento das tarifas de água em 15,24% por determinação de sua agência reguladora, a ARSESP, que é controlada pelo governo estadual.

Mas o que sobrou, ali, foi a sensação que de os paulistas estão com problemas sérios por uma falta completa de rumo de quem deveria saber o que está fazendo. A comissão fez alguns elogios ao novo presidente da Sabesp, Jerson Kelman, comparando-o a sua antecessora.
“Foi um parto para trazer a ex-presidente Dilma Pena para esta casa. Hoje sentimos uma confiança maior da parte de vocês e vemos todos os riscos evitáveis. A questão que eu vejo como problemática é a participação da iniciativa privada. Temos o caso da abertura de ações no Brasil e em Nova York. Há possibilidade de distribuição de dividendos dos lucros neste ano?”, perguntou o presidente da CPI, vereador Laércio Benko (PHS).

Kelman tergiversou e respondeu com a maior cara de pau: “A Sabesp é uma empresa aberta e transparente. O salário dos executivos da Sabesp é público, girando na casa de 20 mil reais. Não entro no mérito se o ganho é alto ou baixo, mas é grande sim perto do restante da população de São Paulo. No entanto, é um salário compatível com uma empresa com valor de mais de 10 bilhões de reais, que é a melhor fornecedora de água e saneamento do país”.

Como é a melhor fornecedora com seu maior reservatório seco? Culpa de São Pedro?

Acredite, esta foi uma das boas respostas de Kelman naquela manhã. Ele falaria absurdos diante de questões mais delicadas.

O relator do processo da CPI, Nelo Rodolfo (PMDB), levantou uma questão política dentro da crise da Sabesp, que liga diretamente ao governador tucano Geraldo Alckmin. “A conclusão do meu relatório, presidente, é que a população está pagando a conta da crise. Nós pagamos a Sabesp e é o próprio estado que nos cobra aumento de tarifas, através de sua agência reguladora ARSESP. O que o senhor acha disso? É correto um órgão do governo estadual fiscalizar a Sabesp, que tem participação do mesmo governo?”, perguntou.

Nelo Rodolfo estava se referindo aos apelos malucos do direito metropolitano Paulo Massato, que mandou as pessoas fugirem para as montanhas.

“Sua pergunta se relaciona com a natureza das agências reguladoras. Fui presidente da ANA, Agência Nacional de Águas, e de Energia Elétrica. Os presidentes têm mandatos e não podem ser expedidos pelo governador. Eu acho que a agência tem independência, pois nós da Sabesp não achamos justo este aumento de apenas 15%, nós pedimos 22,7%. Não queríamos uma tarifa nesse patamar por um capricho”, disse Kelman, usando a própria biografia como blindagem para não entrar na discussão política.

Em nenhum momento da sessão a Sabesp se manifestou sobre a participação majoritária dos governos do PSDB em sua gestão. E nem mencionaram como Alckmin se manteve negando a natureza da crise.

Tudo é responsabilidade do custo da energia, que teria disparado o suficiente para que não houvesse opção a não ser cobrar mais da população.

Laércio Benko ressaltou o óbvio dentro do raciocínio louco da empresa: “Talvez fosse melhor para a Sabesp passar por um período de prejuízo diante de uma crise desta magnitude, pelo bem da população”.

Jerson Kelman defendeu os lucros dos acionistas como uma forma de capitalizar a empresa e fazer os investimentos necessários. O presidente também foi contundente com a possibilidade de um racionamento mais radical.

“Não haverá rodízio em 2015, mesmo considerando as piores previsões de seca. Tomamos as medidas necessárias para diminuir a dependência da população em relação ao Cantareira. A reserva da Guarapiranga, por exemplo, está num patamar de 80%”.

Por que ele precisa apresentar correndo o número de outros reservatórios se o seu maior sistema, que abastece até 70% da cidade de São Paulo, está em 20% e recorre ao volume morto? Desespero?

Parece que sim. Depois da sessão na Câmara, Kelman deu entrevista coletiva à imprensa. Repetiu toda a sua cartilha de desculpas: negou que a Sabesp tenha um plano B de rodízio, caso tudo piore, resumindo. E deu uma resposta muito confusa a uma jornalista que repetiu as mesmas perguntas na coletiva de imprensa, após a reunião da Câmara.

“Uma coisa são os pedidos que a Sabesp fez durante a crise e outra coisa é o que os órgãos reguladores determinaram durante a crise. A previsão de interligações é para o mês de setembro e, bem, se tiver um terremoto as coisas ficarão graves, mas não há motivo pra acreditar nisso agora”, disse o presidente Kelman sem explicar de fato como estão cuidando das obras para reformar o abastecimento das reservas da Cantareira.

O que um terremoto tem a ver com as obras para combater a crise hídrica?

Deus nos proteja.

"Existem apenas três funcionários do governo para fiscalizar a Sabesp", diz o relator da CPI ao DCM

Por Pedro Zambarda de Araujo / Postado em 19 de maio de 2015
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/existem-apenas-tres-funcionarios-do-governo-para-fiscalizar-a-sabesp-diz-o-relator-da-cpi-ao-dcm/

Nelo Rodolfo tem 55 anos e está no seu terceiro mandato como vereador do PMDB na Câmara Municipal. Formado em Direito e dono de um vozeirão grave de sua época como jornalista e radialista na Jovem Pan, ele é o relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga as irregularidades da Sabesp durante a crise hídrica.


O DCM teve acesso ao relatório preliminar da CPI. O documento revê o contrato entre a Sabesp e sua reguladora, a ARSESP, em 2010, num conflito claro de interesses pelas duas entidades terem gestão do governo Geraldo Alckmin. Este mesmo relatório se encerra com 43 “providências, encaminhamentos e indicações” para que a empresa fornecedora de água solucione sua crise, de acordo com os dados de irregularidades analisados pelos vereadores.

Conversamos com Nelo Rodolfo sobre os verdadeiros propósitos por trás dos documentos levantados pela CPI, sobre as investigações do Ministério Público a respeito um suposto cartel de empresas terceirizadas dentro da Sabesp e sobre a criação de uma nova agência reguladora mais independente da Sabesp e da influência dos governos tucanos.

Tivemos acesso ao relatório preliminar da CPI da Sabesp. O principal ponto seria a criação de uma agência reguladora municipal. Isso é correto?

A meu ver, eu entendo que são dois os pontos principais. O primeiro ponto que precisa ser revisto, e que é urgente, é o contrato da prefeitura de São Paulo, que envolve a própria cidade. Quando nós tivemos aqui este documento, celebrado com a Sabesp e aprovado pela Câmara, fugimos de uma licitação para a empresa contratada no fornecimento de água. Eu não sei muitos detalhes porque na época eu trabalhava na Jovem Pan e não estava na política.

Aí você pode me perguntar: qual é a melhor empresa no país em fornecimento hídrico, na prestação deste serviço? É claro que é a Sabesp, não tenho dúvida nenhuma sobre isso. Mas eu entendo que a licitação tinha a obrigação de ser realizada, porque tem cidades da chamada Grande São Paulo e no interior que não são servidas pela Sabesp. Algumas são atendidas por empresas particulares, enquanto outras são companhias dos próprios municípios.

Eu estranhei não existir a licitação e houve a contratação da Sabesp que foi referendada pela Câmara dos Vereadores. Quando foi feito o contrato, estava previsto que a gente deveria ter feito um regulamento sobre a questão das águas.

Como isso funcionaria?

Isso funcionaria através de um plano sobre o saneamento da cidade. Não foi feito este tipo de regulamento pelo Poder Executivo para aprovação na Câmara. Este é o ponto principal a ser revisto pela CPI dentro da Sabesp. O contrato precisa ser revisado. O próprio Supremo Tribunal Federal decidiu que uma cidade como São Paulo não deveria ser gerida como ocorre em outras. O contrato da nossa cidade deveria ser único, só entre nós e a Sabesp, não como está o documento atual. A licitação pode até não tem tanta necessidade, mas a atualização do contrato é importante agora.

Qual é o outro ponto fundamental do relatório da CPI?

O outro ponto é que nós precisamos de uma agência municipal que fiscalize o serviço que está sendo feito pela Sabesp. Não vou questionar se é bom ou ruim, o fato é que quem fiscaliza deveria ser quem paga a conta, aprendi isso desde quando era pequeno. Não se justifica a atuação da ARSESP, que é uma entidade reguladora do governo do estado de São Paulo, fiscalize uma empresa que pertence à mesma gestão. Embora a Sabesp seja uma companhia de capital misto, seu maior acionista é este mesmo governo.

Nós recebemos a informação por aqui que, para fiscalizar a Sabesp no estado inteiro, nós temos apenas três funcionários da ARSESP. É um número irrisório e contribui para a falta de transparência. Eu não sei, por exemplo, qual é a obra que está sendo feita, se está correta ou se o dinheiro descrito no contrato está sendo reinvestido na cidade.

Eu não estou querendo criar nenhum cabide de emprego, sou contra isso. Mas é necessário que São Paulo, a maior cidade do país, uma das principais capitais do país, tenha sua própria agência para regular o entendimento sobre o fornecimento de água. A gente só está conseguindo ver todos esses problemas agora por causa da crise hídrica.

A população sozinha economizou 82% de água. Os moradores sozinhos economizaram uma Guarapiranga inteira hoje e vai lá a ARSESP e determina um aumento de 15% da conta. Eles fizeram isso sem entregar a água e ainda cobrando o triplo da inflação.

E a Sabesp ainda queria um aumento maior de tarifa, não é?

Sim. Por isso temos dois pontos no trabalho da CPI a se acertar. A cidade precisa rever o contrato e criar sua própria agência para gestão das águas.

O DCM apurou junto ao Ministério Público denúncias de empresas terceirizadas formadas por ex-funcionários da Sabesp favorecendo licitações. Vocês estão apurando isso?

Nós colocamos no relatório que, no passado, se previa a situação da seca em São Paulo. Teve um ano que jogamos fora um [sistema] Cantareira em quantidades de água. A Sabesp contratou empresas que eram formadas por ex-diretores, gente aposentada, para desenvolver estudos. A empresa torrou milhões de reais neste processo e o estudo não foi feito direito.

Continuamos com 32% de perdas de água nas tubulações, totalmente desperdiçada, e faltou uma série de medidas que só estão sendo tomadas agora, no momento em que estamos vivendo a crise hídrica.

Isso acontece no mesmo momento em que acionistas ganham bônus milionários, certo?

Exatamente. Por isso eu acho que a CPI serviu para levantar toda essa situação dentro da empresa, e cumpriu seu papel. Gostei muito da presença do presidente [Jerson Kelman] nas duas sessões. Também apreciei a presença da outra presidente, Dilma Pena. Eles foram chamados e respeitaram a Câmara de São Paulo. Através deste trabalho, a população de São Paulo teve conhecimento sobre a situação que estamos vivendo.

Mas apesar dos porta-vozes da Sabesp respeitarem a CPI, o senhor perguntou ao presidente Jerson Kelman sobre a ARSESP e ele não respondeu. O que acha disso, vereador?

Eles não vão responder o que não podem falar. Tenho amigos dentro da Sabesp que eu consultei e acham justo isso, mas ninguém vai falar algo que está incômodo. O presidente da Sabesp não vai dizer que estamos certos porque para ele é mais cômodo que a gente continue na situação atual.

Também é cômodo que eles façam obras agora sem transparência, certo?

A questão da transparência da Sabesp, te digo o seguinte: quem tem essa incumbência para cobrar é a cidade de São Paulo. O município tá muito parado nesta crise. Seus secretários agem de maneira muito cômoda. Eles também não estão cobrando, não que isso seja a maior atribuição deles. No entanto, o maior contrato da prefeitura é com a Sabesp. E a gestão precisa indicar pessoas que estejam dispostas a cobrar para que a população seja bem atendida.


Caos social: a história real por trás da ocupação do exército na Sabesp

Por Pedro Zambarda de Araujo / Postado em 30 de maio de 2015
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-historia-real-por-tras-da-ocupacao-do-exercito-na-sabesp/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.


O sistema Cantareira, depois de cair para menos de 10% no começo de 2015, mantém-se no nível de 19,5% com o uso de volume morto, enquanto as reservas de Alto Tietê, Guarapiranga e Alto Cotia caíram entre 0,1% e 0,3%. Estamos seguros, então?

Diante da imprensa, o presidente da Sabesp descarta a possibilidade de um rodízio pesado e afirma que passaremos o ano apenas com o racionamento parcial das reservas. No, entanto, desde abril nós entramos no período de redução de chuvas.

De acordo com o relator da CPI da Sabesp, vereador Nelo Rodolfo (PMDB), não está claro quais medidas estão sendo tomadas pela agência reguladora, que possui apenas três funcionários para efetuar a fiscalização.

Na manhã do dia 27 de maio, uma quarta-feira, o exército decidiu ocupar o Complexo Costa Carvalho da companhia, no bairro de Pinheiros. Cerca de 70 militares fizeram um estudo de atuação no local “em caso de caos social”. Parecia um ensaio para uma rebelião civil.

O que aconteceu ali?

A resposta para esta pergunta apareceu em uma reunião envolvendo uma pessoa da Sabesp há um mês. O encontro envolveu diretamente o exército.

O Comando Militar do Sudeste (CMSE) organizou um painel no dia 28 de abril em seu quartel-general no bairro do Ibirapuera na zona sul de São Paulo. O tema? “Painel sobre defesa”, como estava escrito nos crachás. A gente precisa se defender do quê?

Foi um debate destinado a oficiais, soldados e alguns professores universitários e simpatizantes do exército. E quem palestrou? O diretor metropolitano Paulo Massato Yoshimoto, ao lado de Anicia Pio, gerente de meio ambiente da Fiesp, e do professor Antonio Carlos Zuffo, do curso de engenharia da Unicamp.

Massato disse a sua plateia seleta que, caso as obras emergenciais não sejam feitas de maneira efetiva, a região metropolitana pode ser severamente afetada em julho deste ano. O diretor é poderoso e é o homem diretamente ligado ao racionamento parcial que ocorre neste momento.

Veio dele a ordem para despressurizar os encanamentos, o que está gerando uma contaminação progressiva da água, além de aumentar as perdas. A medida traz tais problemas, mas evita a necessidade de um rodízio que interrompa de maneira mais severa determinadas regiões da cidade.

Essa estratégia irresponsável ajudou o governador Geraldo Alckmin a passar incólume no primeiro turno das eleições.

Paulo Massato deixou de falar sobre suas previsões catastróficas em público desde o fim do ano passado. Nas audiências públicas na Câmara Municipal, é ele que conversa diretamente com o atual presidente da empresa, Jerson Kelman. O conhecimento técnico está com ele.

A falta de chuvas em 2014 levou o diretor a afirmar em reuniões particulares que talvez fosse melhor que as pessoas deixassem São Paulo.

Fontes do alto e do baixo escalão da Sabesp dizem que Massato, funcionário do setor de perdas de águas desde 1983, seria indicação de Aloysio Nunes Ferreira. Ele está há 32 anos na Sabesp e há 12 no mesmo cargo.

Ainda não sabemos se as previsões apocalípticas de Massato vão se concretizar, mas a imagem dos homens fardados ocupando uma estatal é um sinal eloquente de que os paulistas têm um probleminha pela frente.

EXCLUSIVO: no auge da crise e durante a campanha, Sabesp triplicou gastos com publicidade

Por Pedro Zambarda de Araujo / Postado em 15 de junho de 2015
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/exclusivo-no-auge-da-crise-e-durante-a-campanha-sabesp-triplicou-gastos-com-publicidade/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui.


O DCM obteve as planilhas de investimento em publicidade da Sabesp nos anos de 2010, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015 até o mês de abril. De acordo com os documentos, a empresa gastou R$ 44.462.117,03 no ano passado, quando Geraldo Alckmin foi reeleito no auge da crise da falta de água com pouca cobrança na imprensa. As operações fazem parte do plano de investimentos de uma companhia com valor de mercado estimado em R$ 15 bilhões.

A Sabesp já investiu R$ 20.135.566,03 mi até o mês de abril está numa tendência de alta. O valor é praticamente o dobro dos R$ 11.074.787,61 aplicados entre janeiro e junho do ano passado.

O aumento dos investimentos publicitários da Sabesp reforça as acusações de Renê Vicente dos Santos, presidente da SINTAEMA (Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente), ao Ministério Público do Estado no dia 6 de maio. Funcionário há 18 anos, ele disse aos promotores que a população não foi informada da gravidade da crise na Cantareira de propósito.

“Desde o mês de dezembro de 2013 já era notória, dentro da Sabesp, a gravidade da situação e que esta refletiria no fornecimento de água na região metropolitana. Ficou claro, no entanto, que por se tratar de um ano eleitoral, o assunto não deveria se tornar público”, disse Renê.

A Sabesp divide as propagandas em rádios, jornais, revistas, sites e em outras agências de comunicação. As campanhas são de economia de água e promoção da marca.

O aumento do investimento contrastou com a timidez ou o falso otimismo da cobertura jornalística da crise. A maior parte do montante foi para Globo Comunicações e Participações S/A, TV SBT Canal 4 de São Paulo, Universo Online S/A, Empresa Folha da Manhã S/A, S/A O Estado de São Paulo.

Só na primeira metade de 2014, a Sabesp investiu mais de R$ 11 milhões. Com a seca, o valor aumentou. No segundo semestre do ano passado, o dinheiro de anúncios subiu para R$ 33.387.329,42, o triplo do valor, quando o governador Geraldo Alckmin foi reeleito e o diretor metropolitano Paulo Massato disse que os paulistanos teriam que abandonar a cidade se a seca do Cantareira piorasse.

A maior parte dessas empresas de comunicação é enquadrada como cliente de “demanda firme” em suas contas de água. A Globo e a Folha, por exemplo, possuem descontos de até 75% em suas sedes.

Enquanto a Operação Lava Jato mereceu menções diárias no Jornal Nacional, a seca do Cantareira só ganhou holofotes na Globo no programa Fantástico, e mesmo assim poupando o nome do governador ou de seu partido. O Uol deu manchetes positivas toda vez que o sistema Cantareira aumentava seu volume nas chuvas entre fevereiro e março de 2015. A Veja não deu nada sobre o assunto. A Veja São Paulo, principal revista da cidade, mencionou a questão en passant, sonegando informações importantes aos seus leitores.

Com investimentos milionários em comunicação e uma mãozinha da mídia amiga, a Sabesp mascara sua crise. Nada sobre, por exemplo, as denúncias de que pelo menos oito empresas terceirizadas teriam ex-funcionários em seus quadros e para vencer 42 licitações no projeto de perdas de águas, que é um dos fundamentais para manter o nível da Cantareira mais estável durante a crise.

Atualmente, a Sabesp perde cerca de 30% da sua água em tubulações, com picos de até 40% segundo seus funcionários. O exército já deu as caras na sede. As chuvas pararam em São Paulo em abril. Quando a empresa prezar por transparência e deixar de financiar os amigos com tanta vontade, talvez os paulistas tenham uma chance de passar pela seca com menos sofrimento.

A crise hídrica não é nada perto do colapso financeiro da Sabesp

Por Pedro Zambarda de Araujo / Postado em 23 de julho de 2015
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-crise-hidrica-nao-e-nada-perto-do-colapso-financeiro-da-sabesp/

Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui. Fique ligado.


A Sabesp anunciou no dia 20 de julho que venderá 24 propriedades estimadas em R$ 195 milhões, além de renegociar dívidas de 22 municípios no Cadastro Informativo dos Créditos Não Quitados de Órgãos e Entidades Estaduais (Cadin).

No mesmo dia, o presidente da empresa, Jerson Kelman, deu uma entrevista à Folha de S.Paulo defendendo novamente que não haverá rodízio ou um racionamento mais severo em 2015. O nível do sistema Cantareira, que sofreu a seca mais severa ano passado, está em 19% com o uso do volume morto. E o executivo deu uma declaração, no mínimo, controversa.

“O cidadão paga muitas vezes mais pela conta de celular do que paga pela conta de água”, disse, defendendo que os paulistas podem pagar mais caro do que o aumento de 15,24% das tarifas.

O peso maior nas contas foi aprovado pela ARSESP, órgão regulador da Sabesp. No entanto, a companhia queria um aumento de 22,7%.

Apesar de defender o aumento das tarifas, Jerson Kelman diz em diferentes entrevistas que a população está de fato economizando água. O que ele omite, no entanto, é que a empresa não fiscaliza prédios comerciais que tem suas contas zeradas por falhas de medição.

Fontes técnicas e do alto escalão confirmaram ao DCM que as perdas em cobranças tarifárias nestes edifícios chegam a R$ 200 milhões — o que quase corresponde aos valores de imóveis que a empresa pretende se desfazer neste momento.

A situação financeira da empresa, no entanto, está mais grave do que aparentam as notícias fazem crer.

Só no período do Carnaval, em fevereiro, a Sabesp demitiu 300 funcionários, muitos deles responsáveis pela manutenção de dutos. De acordo com Renê dos Santos, do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema), os cortes chegam a até 600 pessoas se forem considerados tanto 2014 e 2015, período da crise da Cantareira.

No mês de março, o governo do estado tirou dinheiro do tesouro público para quitar dívidas previdenciárias da Sabesp. Foi mais de um bilhão de reais.

Enquanto passou por uma reestrutura profunda, o balanço da companhia em 2014, divulgado naquele mesmo mês, caiu de R$ 1,9 bilhão para R$ 903 milhões. Nos primeiros três meses de 2015, o lucro também caiu de R$ 477,6 para R$ 318,2 na comparação anual. É uma perda na casa de 50%.

Quanto aos gastos internos, a empresa informa que está reduzindo, o que se mostra na diminuição do montante de R$ 2,03 bilhões no ano passado para R$ 1,36 bilhão neste ano. Mesmo assim, os gastos com publicidade já estão em R$ 20 milhões em 2015, o dobro do mesmo período no ano passado.

Uma decisão judicial de 22 de abril de 2014 determinou que cinco antigo altos funcionários já afastados fossem reintegrados ao quadro de funcionários. O DCM teve acesso exclusivo ao documento e a sentença determina uma multa de R$ 50 mil mais pagamento dos salários, 13º, férias proporcionais e depósitos no FGTS ajustados com a atual inflação. O argumento para a condenação foi que as demissões foram sem justa causa no final de 2012.

De acordo com dois funcionários da empresa que pediram anonimato, essa determinação abre um precedente. A Sabesp pode ter um rombo financeiro em suas contratações na escala de milhões de reais enquanto demite cerca pelo menos seis centenas de funcionários que poderiam estar diminuindo os efeitos da crise hídrica.

No relatório da CPI feito pela Câmara Municipal, vereadores de São Paulo pedem a criação de um órgão fiscalizador da prefeitura no lugar da ARSESP de Alckmin, considerando que seu governo já é o acionista majoritário da companhia.

A Sabesp nega oficialmente as informações e diz que as pessoas economizaram água graças aos seus esforços em campanhas. O investimento em propaganda triplicou durante a reeleição do atual governador, Geraldo Alckmin.

Obras num rio seco, condenação por fraude... como a Sabesp ganha dinheiro com seu descalabro

Por Pedro Zambarda de Araujo / Postado em 27 de agosto de 2015
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/obras-num-rio-seco-condenacao-por-fraude-como-a-sabesp-ganha-dinheiro-com-seu-descalabro/

A Sabesp foi condenada pela Justiça do Trabalho a substituir 25% dos empregados contratados irregularmente por meio de empresas terceirizadas. O valor da multa por danos morais coletivos foi fixado em R$ 250 mil no processo.


O caos instalado na empresa vai ganhando novos contornos.

O DCM apurou em sua série de reportagens que a empresa demitiu 600 funcionários entre 2014 e 2015, além de ter perdido processos judiciais por cortes sem justa causa no final de 2012. Houve recontratações de funcionários, muitos ex-superintendentes, além de outra multa de R$ 50 mil pedida pela justiça.

Ainda assim, a Sabesp informou no dia 13 de agosto que teve lucro líquido de R$ 337,3 milhões no segundo trimestre, alta de 11,5% na comparação anual. A receita, no entanto, caiu 7,9% na comparação anual, para R$ 2,05 bilhões.

A má gestão é um bom negócio. A Sabesp investiu R$ 28,9 milhões na transposição do rio Guaió, na cidade de Mauá, para abastecer sua segunda maior reserva hídrica, o sistema Alto Tietê. A represa é utilizada, atualmente, para diminuir a dependência do Cantareira.

Cerca de 50 dias depois da inauguração, o manancial estava seco, segundo o Estado de S.Paulo. Ou seja, uma inutilidade.

As maiores reservas já estão secando novamente em São Paulo. O sistema Cantareira caiu para 15% com as cotas do volume morto, enquanto o Alto Tietê recentemente caiu mais de 20 vezes até chegar no patamar de 14,8%, com a nova escassez de chuvas.

A crise hídrica, portanto, parece distante de uma solução. Com milhões investidos e os níveis cedendo mais, o governo e a empresa estudam transferências de recursos hídricos de outras fontes, como o São Lourenço e a reserva Billings.

Os maus investimentos não afetam negativamente o desempenho na Bolsa. Não interessa resolver rapidamente a crise enquanto a situação financeira estiver estável. Os acionistas privados não se abalam e nem o governo Alckmin se mobiliza.

A seca dos reservatórios demanda aportes milionários para solucionar gargalos, mas as obras são feitas pelas mesmas companhias que já trabalhavam com a Sabesp. A crise é, portanto, uma oportunidade de fazer bons negócios para os dois lados sem uma concorrência real. Todos saem ganhando num nítido conflito de interesses — pelo que as investigações do Ministério Público apontam.

O MP começou a olhar as construções emergenciais sem licitação pública no início de 2015. “O montante que apuramos em nosso inquérito civil é de R$ 160 milhões nas obras emergenciais até o momento. Mas sabemos que a cifra já está maior”, disse o promotor Otávio Ferreira Garcia em audiência na Câmara Municipal.

O Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo divulgou no mês de agosto um relatório com 11 contratos emergenciais no valor de R$ 200 milhões sem licitação. A informação foi fornecida pelo próprio Otávio Garcia, que já estava investigando a Sabesp, e também pelos promotores Alexandra Facciolli Martins e Ricardo Manuel Castro.

A Sabesp não está interessada em solucionar o problema da falta de água em São Paulo. A seca vai se intensificar e a população vai pagar a conta, mais uma vez. O maior problema da cidade, afinal, todo o mundo sabe qual é: as ciclovias comunistas.

"São Paulo merece", diz deputado que premiou Alckmin pelo trabalho na Sabesp. Por Pedro Zambarda

Por Pedro Zambarda de Araujo / Postado em 23 de setembro de 2015
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/sao-paulo-merece-diz-deputado-que-premiou-alckmin-pelo-trabalho-na-sabesp-por-pedro-zambarda/

João Paulo Tavares Papa foi prefeito de Santos entre 2005 e 2009. Saiu do PMDB, seu partido de origem, para se filiar ao PSDB em 2013. Hoje é deputado federal por São Paulo.


O tucano é responsável pela indicação do governador Geraldo Alckmin ao Prêmio Lúcio Costa de Mobilidade, Saneamento e Habitação 2015 promovido pela Câmara em Brasília, durante a abertura do 3º Seminário Internacional de Mobilidade e Transportes em 13 de outubro.

"Modéstia à parte, [o prêmio] é merecido", disse Alckmin nesta quarta-feira (23) em coletiva de imprensa. O governador receberá o reconhecimento por seu trabalho à frente da Sabesp.

Para entender as razões por trás da premiação de Geraldo Alckmin, enquanto os sistemas Cantareira e Alto Tietê se mantém em cerca de 15% e a seca virou rotina do paulista, o DCM foi conversar com o deputado.

Quais foram os critérios que vocês usaram para escolher o governador Alckmin?

O Prêmio Lúcio Costa de Mobilidade, Saneamento e Habitação possui áreas diferentes que tiveram critérios diferentes de seleção. No caso de saneamento básico, nós temos uma intercomissão, dentro da comissão principal, que avaliou a universalização deste tipo de serviço no Brasil. Eles trabalharam muito no começo do ano.

Por que nós fizemos essa pesquisa? Porque mais da metade da população brasileira não tem rede de esgoto. Nós temos um plano que foi aprovado em 2013 que prevê a universalização do serviço até 2033, ou seja, em 20 anos. No ritmo atual de investimentos realizados no país, nós não vamos atingir esse nível das redes nem em 70 anos.

A Sabesp e o governo paulista destoam dessa situação nacional, completamente. Já universalizou na cidade de São Paulo e caminha para isso na região metropolitana. Há um relatório de especialistas no setor, em sintonia com a Organização Mundial de saúde, que prevê que cada real investido em saneamento gera uma economia de 4,3 reais em saúde pública. Ou seja, a falta de saneamento mata e adoece.

Analisando o quadro do país, São Paulo é o melhor dos mundos, com o melhor modelo. É o estado que mais investiu nas duas últimas décadas, continua aplicando dinheiro e, pelos indicadores, não há nenhuma dúvida da competência paulista na área de saneamento. É isso que a gente busca na comissão que avaliou o prêmio. Queremos buscar caminhos no Brasil para diminuir a desigualdade, enorme em setores importantes como o de saneamento.

Mas como vocês chegaram até o nome de Alckmin e não no da Sabesp?

Nesta linha de raciocínio, chegamos até o governador de São Paulo, que é o Geraldo Alckmin. A comissão foi até o estado, conhecemos as obras, os sistemas e o enfrentamento da crise e voltou com uma impressão muito diferente do que tinha antes de conhecer tudo. É mais por isso que o escolhemos, pelo bom desempenho paulista na área de saneamento básico.

A Sabesp é a maior empresa de saneamento do Brasil. Estamos enfrentando a maior seca em 80 anos, mas o governador vem errando há muito tempo…

Olha, essa premiação é para um projeto que vê a política de longo prazo de um estado nacional, em relação aos demais. Não estamos premiando a crise, nem contra a crise e nem a favor dela (risos). A crise hídrica vai passar, tá certo?

Estamos diante de uma crise climática, completamente imprevisível e é a mais severa dos últimos anos. É uma seca que acontece na maior região com saneamento do país. São Paulo é o maior estado que necessita de abastecimento. São mais de 20 milhões de pessoas concentradas em uma região de cabeceira de rios.

Os métodos que a Sabesp está adotando para enfrentar a crise são defendidos pelo governo do estado. No entanto, é óbvio que existem posições conflitantes neste enfrentamento. Há quem critique que não deveria ter isso e que deveria se fazer aquilo. Até que a crise está controlada, embora não se tenha ainda um ritmo de chuvas normais.

O sistema Cantareira há três anos transbordava água. Hoje a situação é muito diferente e exige dos engenheiros e dos técnicos que eles repensem todo o modelo de gestão desse sistema da grande São Paulo. Mas é uma crise pontual, que vai passar, e o governo tomou as decisões que precisava tomar.  Transposições de água que não eram previstas para agora já estão sendo feitas. Há um esforço do estado de São Paulo, não só da Sabesp, que está universalizando o saneamento.

Há investigações no Ministério Público de São Paulo que apontam que a Sabesp formou cartel de empresas terceirizadas, há relatos de demissões e até obras de milionárias com um rio seco. Não falta gestão? O governo, como controlador da empresa, não poderia interferir?

Essa premiação, repito, não é para a Sabesp. A empresa não está sendo premiada e sim o estado por ter um sistema de saneamento universal, o que ainda destoa do restante do Brasil. O modelo de São Paulo é um exemplo do que deve ser aplicado em outros estados nacionais.

As polêmicas, e os crimes, devem ser devidamente investigados pelas autoridades, tanto do Ministério Público como em outras instâncias. Mas o trabalho de saneamento, não o da crise hídrica, foi reconhecido por esta comissão que eu mencionei.